A escalada da taxa Selic vai exigir mais esforço do governo federal para encontrar espaço fiscal e conseguir anunciar um novo Plano Safra maior e acessível aos produtores a partir de julho. Os R$ 15 bilhões reservados no orçamento de 2025 para bancar a subvenção das operações que forem contratadas no segundo semestre devem ser insuficientes. Será necessário mais R$ 1,6 bilhão para fechar a conta, segundo fontes da equipe econômica do governo.
O crédito extraordinário de R$ 4,1 bilhões, aberto em fevereiro pela medida provisória 1.289/2024, serviu para retomar as operações equalizadas que foram suspensas temporariamente na temporada 2024/25 e é de uso exclusivo para as operações desta safra, até junho.
Em fevereiro, técnicos em Brasília já estimavam a necessidade de suplementar o caixa da equalização com R$ 5,7 bilhões, mas nem todo o recurso pôde ser incluído na MP. Os R$ 1,6 bilhão que serão usados apenas para cobrir operações futuras do segundo semestre não se encaixaram nas regras de relevância, urgência e imprevisibilidade que justificam o crédito extra, e ficam fora. Agora, com falta de espaço fiscal para acomodar todas as despesas federais, o governo também não conseguiu incluir o valor restante na Lei Orçamentária Anual (PLOA) aprovada na semana passada pelo Congresso.
O déficit ainda poderá ser resolvido posteriormente, com crédito suplementar. Até lá, o governo vai acompanhar o ritmo de acesso aos financiamentos subsidiados para verificar eventuais “sobras” do orçamento que poderão ser utilizadas mais para frente neste ano.
Equipes técnicas dos ministérios também farão os cálculos sobre a necessidade orçamentária a partir das taxas de juros e do volume de recursos que serão definidos para o próximo plano — se caberá dentro do R$ 1,6 bilhão ou se o pedido terá que ser maior.
As negociações para a construção do Plano Safra 2025/26 serão intensificadas a partir de abril. Em meio à escalada da Selic, que está em 14,25% com previsão de subir mais em maio, o plano poderá ser um dos mais caros dos últimos anos para a União, a depender das condições que serão alinhadas. Em 2024, o orçamento original destinou R$ 12,1 bilhões para a equalização de juros. Em 2025, a conta já passou dos R$ 19 bilhões, com a verba da LOA e o crédito extraordinário, e deverá crescer.
Do orçamento, R$ 15 bilhões são usados para equalização do Pronaf (R$ 8,3 bilhões), do custeio agropecuário (R$ 1,5 bilhão) e dos investimentos rurais (R$ 4,1 bilhões). A verba banca ainda o alongamento de dívidas (R$ 826,5 milhões), o apoio a produtores de cacau da Bahia (R$ 106 milhões) e a subvenção de operações de comercialização de produtos agropecuários (R$ 15,3 milhões).
A equalização apoia financiamentos contratados ao longo de 2025 e o estoque de operações de anos anteriores, que é maior e que também fica mais caro com a alta da Selic. A subvenção é paga mensalmente sobre o saldo ativo dos bancos que liberam recursos a taxas mais baixas que as de mercado aos produtores. Nos primeiros meses do ano, porém, quase todo o recurso já estava comprometido com empréstimos do passado por causa desse aumento dos custos.
No caso dos R$ 4,1 bilhões extras liberados no mês passado, os bancos precisam identificar cada operação com um código específico para controle do Tesouro Nacional sobre o gasto. É como se o recurso fosse “carimbado” e fizesse parte de um orçamento novo, dedicado apenas aos contratos até junho.
Para abrir os financiamentos equalizados do Plano Safra 2025/26 em julho, a necessidade atual está em R$ 1,6 bilhão. As contratações ganham força só a partir de setembro, às vésperas da safra, e por isso a necessidade no segundo semestre é menor se comparada ao primeiro semestre.
Nesse cenário, o Ministério da Agricultura busca espaço para estimular a produção de hortifrutigranjeiros por médios agricultores e para manter descontos nos juros do custeio, de 0,5 ponto percentual, para quem adota boas práticas. O ministro Carlos Fávaro admitiu a dificuldade para construir um Plano Safra maior.
“Estamos estudando alternativas para incrementar o funding, o recurso disponível para o próximo Plano Safra”, disse na semana passada. “Já tomamos a decisão de potencializar o Pronamp. Os médios produtores terão prioridade com o direcionamento de culturas importantes para o bom abastecimento dos alimentos que vão à mesa dos brasileiros.” Culturas agroflorestais, como cacau e café, também terão estímulos.
O secretário de Política Agrícola, Guilherme Campos, disse que o desafio é fazer um Plano Safra “no mínimo do mesmo tamanho e com a mesma abrangência”, mas com a taxa Selic muito maior que a de 2024 e com o Tesouro mais apertado. “No cenário atual, é difícil falar em manutenção de taxa de juros e em ampliação de recursos do orçamento. Teremos que achar um blend”, disse ao Valor.
Para o presidente da Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), Márcio Lopes de Freitas, a alta de juros é certa na próxima temporada. “Não tem espaço para manter juros com a Selic a 14,25% e com tendências de alta. A ideia é subir o mínimo”, afirmou.
Ele não vê muito espaço para aumentar exigibilidades de aplicação de Letras de Crédito do Agronegócio (LCAs), atualmente a principal fonte de recursos do Plano Safra. Fávaro defende uma flexibilização dos títulos para engordar o funding em 2025/26.
Freitas, que preside uma entidade que representa cooperativas de produtores e de crédito, vê espaço para agregar a rede de fornecedores de insumos e as multinacionais no financiamento da agropecuária, e com mais dinheiro internacional. “Temos que ter políticas que compreendam isso”, defendeu.
Ele citou a possibilidade de isenção tributária para captação externa e uso de mecanismos para ampliar o leque dos financiamentos, já que as linhas existentes em dólar ainda têm intermediários mais o custo de hedge. O presidente da OCB também defendeu mais espaço para que as cooperativas de crédito operacionalizem fundos constitucionais e limites equalizáveis.