A elevação da taxa Selic e o aumento do número de renegociações de dívidas rurais no país têm dificultado a formulação do Plano Safra 25/26. O cenário afetou tanto a disponibilidade de recursos nas instituições financeiras, para empréstimo aos produtores, que são os tomadores finais, quanto a efetividade do orçamento da União para subsidiar os juros de parte desses valores. O custo de equalização mais do que dobrou em comparação com o Plano Safra 2024/25.
O governo fala em um Plano Safra com cifras próximas de R$ 600 bilhões para o ciclo 2025/26. Entram na conta as linhas tradicionais de crédito rural e as Cédulas de Produto Rural (CPR) que os bancos vão emitir a partir de montantes direcionados, que as instituições financeiras são obrigadas a aplicar. O aumento das taxas de juros no próximo Plano Safra é dado como certo em Brasília, e há um apelo do Executivo para que o Congresso Nacional garanta mais verba para subvenção no orçamento de 2026 e dos próximos anos.
“Esse é um dos anos mais difíceis por dois motivos: o primeiro é a falta de recursos para emprestar, e o segundo, a falta de recursos para equalizar, reduzir a taxa de juros”, disse Gilson Bittencourt, subsecretário de Política Agrícola e Negócios Agroambientais do Ministério da Fazenda, durante audiência no Senado Federal nesta semana.
Para tentar driblar uma possível escassez de recursos, a equipe econômica já aumentou o percentual de valores que os bancos são obrigados a aplicar em financiamentos agropecuários. A partir de julho, os depósitos à vista passarão de 30% para 31,5%, a poupança rural, de 65% para 70%, e as Letras de Crédito do Agronegócio (LCAs), de 50% para 60%. Mesmo assim, ainda há preocupação.
A medida pode ampliar o montante total disponível para novos empréstimos, mas o efeito é limitado. Isso porque grande parte do dinheiro dessas fontes está “comprometido” com prorrogações de parcelas feitas nos últimos anos. No caso dos depósitos à vista, por exemplo, a estimativa é que existam R$ 330 bilhões em caixa, dos quais cerca de R$ 95 bilhões precisam ser emprestados para o agro.
“O problema é que 50% disso está já travado em renegociações. Para fazer o Plano Safra, só posso computar com a diferença que eu tenho, porque as instituições financeiras cumprem o direcionamento mesmo com operações renegociadas. De dinheiro novo teremos somente cerca de R$ 40 bilhões ou R$ 50 bilhões”, explicou Bittencourt.
No caso da poupança rural, além das prorrogações, o dinheiro aplicado em empréstimos para investimentos de longo prazo também está “consumido” durante todo o período da operação. “Neste ano, em função do uso de recursos da poupança para a equalização ou de recursos comprometidos com renegociação, temos menos recursos disponíveis para emprestar”, indicou.
Uma alternativa foi exigir aplicação dos depósitos à vista das cooperativas de crédito, de forma escalonada, a partir da safra 2025/26. Segundo Bittencourt, há hoje cerca de R$ 100 bilhões nessa fonte. Com a exigência de aplicar 6% a partir de julho, serão R$ 6 bilhões a mais garantidos no caixa do Plano Safra 2025/26, sem custo adicional, disse o subsecretário.
No caso das LCAs, principal fonte de recursos do Plano Safra, estima-se que haja um saldo médio de R$ 640 bilhões na próxima temporada e que 60% disso seja aplicado em crédito rural ou CPRs. “Com aumento da exigibilidade de 50% para 60%, aumenta em R$ 64 bilhões a disponibilidade de recursos para a safra”, apontou Bittencourt.
“Se a taxa de captação era 10,5% e havia um spread de 4%, o custo efetivo por ano era de 14,5%. Cobrava-se 12% do produtor, e o custo [do Tesouro] era de 2,5%. Como a Selic a 14,75%, acrescido dos mesmos 4% de spread, vou para 18,75%. Se eu tirar os mesmos 12%, tenho um custo de 6,75%”, explicou. “Se o custo era de R$ 1 bilhão, agora será de R$ 2,5 bilhões. Essa é a conta: mais do que o dobro para equalizar a mesma quantidade”, resumiu ele.
A outra dificuldade do governo é com a equalização dos juros, a diferença que o Tesouro Nacional paga aos bancos entre o custo de captação do dinheiro no mercado mais o spread e as taxas finais cobradas dos produtores. Segundo Bittencourt, o salto da Selic, que era de 10,5% em julho do ano passado, no início do Plano Safra em vigor, e está agora em 14,75%, aumentou em 40% o custo para subsidiar financiamentos aos pequenos produtores. No caso dos médios, o gasto subiu 70%, e para os grandes, 150%.
Bittencourt disse que o foco do Plano Safra deverá ser o apoio ao custeio, já que, como os juros estão altos, muitos investimentos deverão ser adiados. “Eu acho que vai ser muito difícil que as taxas de juros não subam. Vai depender de quanto for demandado para cada linha”, afirmou. Segundo ele, na primeira quinzena de junho, os ministérios da Agricultura e do Desenvolvimento Agrário vão apresentar as prioridades. Nas semanas seguintes, serão definidos os limites e os juros.
O subsecretário evitou citar números e disse que o Plano Safra 25/26 será o “mais viável possível”. O governo vai mais uma vez incorporar à soma de recursos do plano o dinheiro emprestado via CPR direcionada, emitida a partir da exigência de aplicação das LCAs. Com isso, explicou, o montante a ser anunciado pode ser próximo dos R$ 600 bilhões que o setor produtivo tem pedido.
Bittencourt pontuou que mais de 50% do Plano Safra é composto de recursos a juros livres, mas que a maior parte é fruto de direcionamento, exigências do governo para aplicação no setor. “Não é porque a instituição está aplicando por uma boa vontade, só porque ela tem essa demanda. Essa parte é muito pequena”, disse. Entre julho do ano passado e abril deste ano, esse percentual foi de apenas 2%.
Bittencourt lembrou que a maior parte do impacto do Plano Safra sobre o orçamento da União fica para o ano seguinte, já que as contratações se concentram a partir de outubro. Ele pediu apoio do Congresso para garantir verba para equalização.