O hipismo brasileiro está de luto. A égua Miss Blue, que esteve na delegação do Brasil nos Jogos de Paris, em 2024, morreu na última terça-feira, 24 de junho, vítima de uma torção intestinal de 360 graus. O animal da raça Brasileiro de Hipismo iria completar 12 anos em 9 de setembro.
Miss Blue morava no centro de treinamento do cavaleiro olímpico brasileiro Yuri Mansur em Venlo, no sudeste da Holanda. Era o único animal brasileiro com vitórias nos mais importantes GPs (Grand Prix) europeus. Nas provas de salto nos Jogos Olímpicos, não derrubou nenhuma vara na passagem, mas foi desclassificada após refugar diante de um muro.
Thalita Gorri Olsen de Almeida, proprietária de Miss Blue, disse que a égua sofreu cólicas em junho de 2023 e também cinco dias antes de embarcar para Paris, em 2024, mas se recuperou rapidamente. Desta vez não houve tempo de fazer nada.
“Ela treinou com o Yuri naquele dia e estava normal. Por volta de 15h30 (10h30 no horário brasileiro), começou a ter mal-estar, foi medicada para gases e a mulher do Yuri, Louise, tentou passear com ela, mas Miss Blue puxou a guia, deitou no chão, fechou os olhos e morreu imediatamente, sem se debater ou mostrar dor”, conta Thalita.
O veterinário que tratava de Miss Blue, que tem uma clínica próxima do local onde a égua vivia, não conseguiu chegar a tempo de salvá-la.
Após a morte, Thalita entrou em contato com a seguradora e pediu autorização para examinar o animal, descobrir a causa da morte e retirar o ovário e os oócitos. Segundo a proprietária, a torção intestinal impediu Miss Blue de respirar. Mesmo que houvesse uma sala de cirurgia pronta, não haveria o que fazer.
Yuri Mansur, que treinava a égua há três anos e a considerava um “presente de Natal”, contou à reportagem que a morte foi súbita.
“Foi uma perda terrível, uma dor imensurável. Mas fica a alegria e a gratidão de encontrar um animal dessa genialidade, de ter conquistado com ela os maiores GPs do mundo, ter ficado entre os três melhores conjuntos do mundo por um tempo e ter participado da Olimpíada de Paris”.
Miss Blue será clonada
Segundo Thalita, o material genético de Miss Blue já está na Argentina para o processo de clonagem. Além dos óvulos congelados, a égua tinha 28 oócitos no ovário. Um óvulo pode custar até 200 mil euros.
A proprietária de Miss Blue conta que, em 2023, recebeu uma proposta “bastante alta” (não revela o número) de investidores árabes, mas decidiu não vender a égua, porque sonhava com sua participação na Olimpíada.
“Para se ter uma ideia do valor de um animal desses, o dono do campeão belga, Ermitage Kalone, recebeu uma oferta de 30 milhões de euros na Olimpíada.”
Em suas redes sociais, Thalita, que esteve na Itália neste ano vendo a vitória de Miss Blue no Grande Prêmio Rolex de Roma, publicou um texto emocionado, dizendo que não será fácil acordar e saber que não vai mais receber uma mensagem do Yuri ou da Louise contando as ‘estripulias’ da sua égua.
Ela diz que Miss Blue aprendia com uma “rapidez impressionante”, tinha muita personalidade, era mal-humorada, brava, rabugenta, mas também era doce, a reconhecia de longe e sempre a saudava com uma lambida.
“Cada campeonato era uma nova expectativa, uma ansiedade boa pela emoção que sabíamos que viria. Miss Blue era como Ayrton Senna. Acordávamos aos domingos com o coração acelerado, prontos para ver o que ela faria. Uma verdadeira ídola, que ficará para sempre nas nossas memórias.”
Miss Blue colecionou prêmios
Criada pelo Haras Rosa Mystica, de Salto de Pirapora (SP), e registrada na Associação Brasileira de Cavalos de Hipismo (ABCCH) como Miss Blue Mystic Rose, a égua foi comprada por Thalita com um ano e meio de idade, e registrada na Federação Equestre Internacional (FEI) como Miss Blue-Saint Blue Farm.
Justamente no dia em que morreu, saiu o registro de seu novo nome: Miss Blue Olsen Stables, nome do haras de Thalita, em Sorocaba (SP), onde são criados 19 cavalos de competição, incluindo um irmão de Miss Blue, Chacco Star.
Neste ano, além do GP de Roma, o conjunto Miss Blue-Yuri Mansur ganhou o GP de Fontainebleau, na França. Em 2023, a dupla conquistou o 1º lugar no GP Europa de Aachen, na Alemanha. Também venceu em Hamburgo e foi medalha de prata na Copa das Nações, em St. Gallen, e medalha de ouro na Copa das Nações, em La Baule. Eles estavam classificados para disputar novamente Aachen e Ocala, na Flórida.
Filha do garanhão Chacco-Blue, número um do mundo em saltos por cinco anos consecutivos, Miss Blue é resultado de cinco gerações de éguas nascidas em solo brasileiro. A tataravó dela, Anaconda, foi importada no final dos anos 80 da Alemanha. Magnólia, a mãe, foi uma das primeiras éguas brasileiras a participar de competições pelo mundo, e representou a Guatemala nos Jogos Pan-Americanos de Lima, no Peru, em 2019, sendo finalista.
Em nota, o Haras Rosa Mystica, onde Miss Blue foi criada e onde vive Magnólia, também lamentou a morte do animal. “A conexão que construímos transcendeu o simples relacionamento entre criador e animal. Para nós, era como uma filha, levava nosso nome, nos ensinou sobre força, perseverança e a beleza de espírito. Ficou na história de nossa família.”