As ondas de calor e a falta de chuvas que afetaram a safra de verão de grãos também prejudicaram a produção de sementes de soja para plantio na atual temporada, a 2024/25. Empresas do setor relatam queda na produtividade e na qualidade de sementes. Como resultado, contratos de compra de sementes de soja foram cancelados em Mato Grosso, com risco de descredenciamento de sementeiras.
Segundo a Croplife Brasil, que reúne associados como GDM, Basf, Bayer e Syngenta, houve problemas mais localizados no Sul do país e em Mato Grosso. “Esses problemas podem afetar o volume de algumas cultivares específicas, porém o quadro geral não indica nenhuma grande variação que levaria a uma falta generalizada de sementes”, diz Renato Gomides, gerente financeiro da CropLife Brasil.
“Talvez o produtor não encontre algumas variedades específicas de sementes, mas o mercado, como nós, teremos outras variedades para atender a demanda de plantio”, afirma Fernando Prudente, diretor dos negócios de soja e algodão da Bayer. Ele confirma que em Mato Grosso e Rio Grande do Sul os problemas climáticos interferiram na produção e na qualidade das sementes.
De acordo com Prudente, no Rio Grande do Sul, algumas variedades de soja de ciclo longo foram mais afetadas. Em Mato Grosso, o impacto foi em variedades de soja precoce e de ciclo médio.
A GDM também sentiu o impacto devido ao clima no Centro-Oeste, mas afirma que o fato de ter multiplicadores de sementes espalhados pelo país ajudou a diluir os riscos. “Alguma variedade teve mais problemas, mas no geral não haverá falta de sementes”, diz Ignacio Bartolomé, CEO da GDM.
Na Basf, a produção pulverizada também ajudou, e a empresa afirma não ter tido impacto. “Nossa produção de sementes no Brasil é pulverizada em vários Estados, visando justamente mitigar esses riscos”, diz Graciela Mognol, diretora de marketing para sistemas de cultivo de soja da Basf.
Procuradas, Syngenta e Corteva não quiseram se manifestar sobre o assunto. A CropLife Brasil não comentou sobre o descredenciamento de sementeiras.
Uma fonte do setor, que preferiu não se identificar, afirmou que alguns produtores vêm sendo descredenciados porque não conseguiram entregar as sementes no volume e na quantidade acordados. Um deles seria a Sementes Campeã, do Agrogalaxy.
Procurado, o Agrogalaxy não quis comentar o assunto. Na divulgação do balanço da companhia, a Sementes Campeã aparece com uma receita de R$ 56,1 milhões nos seis primeiros meses de 2024, uma queda de 10,3% em relação ao primeiro semestre de 2023. O Agrogalaxy, por sua vez, apresentou no primeiro semestre queda de 47,6% na receita com sementes, para R$ 177,6 milhões.
A Boa Safra, uma das maiores no segmento de sementes de soja no país, também não se pronunciou sobre a questão. Em seu balanço financeiro, informou que as variações climáticas provocaram queda de produtividade, mas a empresa ampliou em 57,6% os campos de multiplicadores de sementes, para 227 mil hectares. E com isso mitigou os efeitos adversos climáticos. A carteira de pedidos da empresa atingiu R$ 1,17 bilhão no segundo trimestre, estável em relação ao mesmo intervalo de 2023.
Além do calor, chuvas também afetaram a qualidade das cultivares em alguns casos. Segundo Luciano Albernaz, diretor de sementes da Lavoro, variedades precoces e superprecoces tiveram quebra de 30% no centro-norte do país, por causa do calor intenso no fim do ano passado, que obrigou os produtores a fazerem o replantio. No caso das sementes de ciclo médio, o problema foram as chuvas.
“Houve um problema seríssimo de chuva em abril, que afetou a qualidade das variedades de ciclo médio”, afirma Albernaz. Na região de Serra da Petrovina (MT), a perda chegou a 40%, diz.
Apesar desse cenário, a empresa conseguiu garantir o suprimento de sementes para a safra 2024/25 porque tomou posição no mercado mais cedo, afirma o executivo. “Tivemos alguns cancelamentos, mas não impactaram no negócio como um todo, porque conseguimos suprimir com uma carteira diversificada de sementes”.
Perdas pontuais
Ronaldo Troncha, presidente executivo da Associação Brasileira de Sementes e Mudas (Abrasem), afirma que as perdas na produção de sementes foram pontuais, afetando mais Mato Grosso e Rio Grande do Sul. E apesar dessas perdas, ele diz, a produção de sementes de soja deve atingir 49,96 milhões de sacas de 40 quilos — em 2023, foram 49,63 milhões.
A Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) estima que a produção de sementes de soja no ciclo 2023/24 atingiu 3,4 milhões de toneladas, 100 mil toneladas acima da safra anterior.
“Em termos de volume, a situação está tranquila. O que vai acontecer é que nem todo produtor vai conseguir adquirir as sementes de mais alto padrão genético”, afirma Troncha. O dirigente estima que 70% das sementes de soja para a safra 2024/25 já tenham sido vendidas. No ano passado, nesse mesmo período, o índice chegava a 80%.
Fonte de uma grande empresa diz que a maior preocupação é com o risco de inadimplência. Parte dos produtores ainda não pagou as revendas pela compra de insumos da safra passada. Com isso, as revendas se recusam a vender produtos para a safra atual antes de receber pela dívida antiga. A expectativa é que com a liberação de recursos do Plano Safra as vendas se acelerem.