Apesar do nível de emprego em alta e da inflação reduzida — fatores que ajudam muito o consumo — o setor de shopping centers não tem deslanchado. As vendas estão abaixo do previsto, e a razão para isso não está clara, afirma o presidente da Associação Brasileira de Shopping Centers (Abrasce), Glauco Humai.
“O momento é estranho. A economia brasileira em geral vai bem. Os números operacionais da indústria de shoppings também estão bons. Mas as vendas estão andando de lado”, disse, em entrevista.
“A percepção é que poderiam estar melhores, mas estão abaixo do esperado”.
As vendas nos shoppings em maio tiveram alta nominal (sem contar inflação) de 1,5% na comparação com o mesmo mês do ano passado. Isso representou uma melhora em relação a abril, quando caíram 7,9% na mesma base de comparação.
Já o tíquete médio foi de R$ 121,55 em maio, recuo de 6% em relação aos R$ 129,01 do mesmo mês do ano anterior.
No acumulado de janeiro a maio, as vendas da indústria tiveram queda nominal de 0,4%, segundo dados da Abrasce. A associação não divulga o relatório mensal, que foi obtido pela reportagem com fontes de mercado.
“Não tem nada de mal, mas as vendas andam meio ‘café com leite’”, comentou Humai, na entrevista. Segundo ele, a ocupação dos shoppings e a inadimplência dos lojistas estão saudáveis e dentro dos patamares históricos, portanto, não são pontos de preocupação.
Além disso, a atividade comercial está aquecida, com um ritmo positivo de locação de espaços a lojistas.
Segundo o relatório da Abrasce, a vacância mediana de maio foi de 4,8%, queda de 0,4 ponto porcentual na comparação anual. Por sua vez, a inadimplência foi de 4%, recuo de 2 pontos porcentuais na mesma base.
Os dados de junho ainda estão sendo apurados, mas um levantamento preliminar não indica uma recuperação. Pelo contrário, as vendas do Dia dos Namorados caíram 1,8%, contrariando as expectativas da associação, que eram de uma alta de 4,2%.
As empresas listadas na bolsa — Multiplan, Iguatemi e Allos — se sobressaíram, com crescimento das vendas em torno de 10% conforme balanços referentes ao primeiro trimestre.
Essas empresas são donas de shoppings em regiões centrais e expostos a consumidores de maior poder aquisitivo. O maior problema do setor, portanto, estaria nas empresas de capital fechado, com empreendimentos em cidades do interior, bairros periféricos, e/ou unidades de menor porte, com público de menor poder aquisitivo.
O presidente da Abrasce diz que não é possível explicar, com exatidão, o motivo de as vendas do setor não estarem deslanchando apesar de a economia brasileira ter crescido mais que o previsto nos últimos meses.
Uma hipótese é que a dívida das famílias permanece alta, o que ainda compromete bastante o poder de compra das famílias de média renda.
Outro ponto é que a taxa de juros também segue alta, encarecendo as compras parceladas, como móveis, eletrodomésticos e celulares, por exemplo.
Humai descarta a possibilidade de o setor estar perdendo faturamento pela concorrência dos sites de apostas esportivas (as chamadas bets). Algumas varejistas já indicaram que as bets têm abocanhado um pedaço relevante do bolso dos consumidores, afetando as vendas de mercadorias.
Já na visão de Humai, essa é uma realidade maior entre os consumidores de renda baixa, que não são o principal público dos shoppings, mais voltados aos consumidores de renda média e alta.
Perspectivas incertas para o 2º semestre
Para o segundo semestre, a expectativa é de que haja uma reação das vendas em função de um mercado de trabalho aquecido, melhora das condições financeiras dos consumidores e menores pressões inflacionárias.
Por outro lado, pesam as incertezas da situação fiscal do país e as incertezas políticas com as eleições municipais.
O presidente da Abrasce observa que a “taxa das blusinhas” foi importante para inibir a importação de produtos que não pagavam impostos, competindo de modo desigual com as varejistas locais.
“A aprovação foi importante porque tinha aí uma competição desigual. Agora vai dar uma segurada nas importações, o que favorece as vendas locais”, prevê.
No início deste ano, a Abrasce divulgou a projeção de crescimento nominal de 4% para as vendas do setor em 2024.
Humai não antecipa se o cálculo vai mudar. Entretanto, dado o desempenho abaixo do esperado até maio, uma revisão para baixo está no radar.
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