Antes mesmo de entrar em vigor, a tarifa de 50% dos Estados Unidos sobre as importações de produtos brasileiros começou a pesar nas contas de Sidinéia Lusia da Silva e Tobias Soares da Silva. Eles pescam lagosta na comunidade Redondo, em Itapuí (CE), perto da divisa com o Rio Grande do Norte. E afirmam que o preço pago ao pescador já caiu.
“Estavam pagando R$ 130 o quilo pela cauda da lagosta antes desse anúncio (tarifaço). Agora caiu para R$ 110. A lagosta inteira caiu de R$ 90 para R$ 70. Nesta época do ano, a tendência era aumentar. Tem pescador que nem está saindo para o mar porque não paga as contas”, diz Sidinéia.
A pescadora tem 43 anos. Neste momento, não está na atividade, porque o barco que pertenceu ao seu pai está em reforma. Tobias continua indo ao mar três meses por semana. Afirma não ter outra opção. “A gente não esperava tomar essa bola nas costas do tarifaço”, lamenta, acrescentando que, depois de dois anos de bons volumes, a captura diminuiu.
Na pesca de atum no Rio Grande do Norte, o mar é “disputado” por cerca de 200 barcos de pescadores artesanais e pelos chamados empresariais, com maior especialização, afirma Rodrigo Fauze Hazin, diretor da Norte Pesca, de Natal, capital do Estado. É o que ele chama de “canibalização”.
“Há cinco anos vem crescendo a pesca artesanal no Estado. Cerca de 70% do que eles pescam são atuns que vão para a indústria de enlatados, mas os 30% restantes são grandes que vão para o mercado paulista concorrer com nosso produto”, diz ele.
O executivo explica que a pesca do atum é custosa. Com as iscas de lula importadas da Argentina, óleo diesel, tripulação e outros gastos, um navio já sai para o mar com custo de R$ 300 mil. Se trouxer pouco peixe ou se não tiver bom preço, é prejuízo na certa.
“Se a tarifa for mantida, armadores vão preferir parar os barcos. Outros vão buscar o mercado interno, que não tem condições de absorver toda a produção. O preço vai cair bastante. E, neste ano, a pesca está muito ruim, abaixo da média. Já está difícil rentabilizar a atividade”, lamenta.
A tarifa sobre a importação de produtos brasileiros pelos Estados Unidos passa a valer no dia 1º de agosto. Mas, desde seu anúncio pelo presidente Donald Trump, criou um cenário de incerteza que levou importadores a suspenderem encomendas e exportadores sem saber a que preço cargas em alto mar vão ser desembarcadas nos portos americanos.
Lagostas e peixes vermelhos
Cadu Vilaça é presidente do Coletivo Nacional da Pesca e Aquicultura (Conep), que agrega entidades representativas do setor como sindicatos de armadores e indústrias processadoras de pescados. Diz que o tarifaço atinge em cheio a cadeia dos produtos que têm como destino preferencial o mercado americano, como os peixes vermelhos (pargo, cioba, arioco, guaiúba) e lagostas.
Ele explica que mais de 95% da carga é congelada e depende do tempo de viagem dos portos de origem até o de destino.
“Já se sabe que não é mais possível que isto aconteça antes de 1º de agosto, portanto várias empresas já recolheram, não compram mais o pescado ou então reajustaram compras considerando que o importador americano vai repassar o valor da sobretaxa de importação para os fornecedores”, afirma.
A mesma preocupação existe nos negócios com o atum, exportado ainda fresco e de avião, acrescenta Cadu. Os negócios já têm a perspectiva de ruptura. Ele pondera que há diferenças entre as empresas, porque algumas são menos dependentes das compras dos Estados Unidos. Mas, no geral, o setor pesqueiro ficou “em choque”, com o anúncio do governo Trump.