Os lácteos, que já andam mais caros nas gôndolas dos supermercados, podem ficar ainda mais. O período seco mais extenso no Centro-Sul do Brasil, onde está grande parte da produção nacional de leite, afetou a captação da matéria-prima pelos laticínios, que já pagaram mais por ela no último mês. Esse cenário reflete a falta de chuvas que afeta as pastagens nos Estados de São Paulo, Minas Gerais e Goiás, as três principais bacias leiteiras do Centro-Sul.
De acordo com levantamento da Scot Consultoria, a captação de leite nesses Estados subiu 0,7%, 1,7% e 1,8%, respectivamente, em agosto. O desempenho ficou bem abaixo da previsão inicial que era de crescimento entre 4% e 5%, segundo a analista Juliana Pila.
Diante da oferta abaixo do esperado, o valor pago pela indústria pelo leite captado em agosto teve alta de 1,7%, segundo a Scot. Considerando a média nacional ponderada nos dezoito Estados pesquisados pela empresa, o litro de leite ficou em R$ 2,532.
“Esse movimento aconteceu justamente porque a produção não vem crescendo conforme esperávamos”, diz. De acordo com a analista, a previsão era de queda nos preços em setembro, acompanhando o movimento iniciado em agosto.
“A nossa expectativa é que [o preço em] setembro ainda seja impactado por esse período de calor extremo, seca e pelas próprias queimadas”, acrescenta.
Sem garantia de lucro
A alta no preço do leite, no entanto, não significa que o produtor está lucrando. Até porque a seca afeta a produtividade do rebanho e aumenta a necessidade de suplementação do alimento do gado, o que significa aumento de custos.
De acordo com o presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Minas Gerais (Faemg), Estado que concentra cerca de 30% da produção nacional de leite, o prejuízo para o setor é dado como certo este ano. “Estamos diante de uma enorme interrogação sobre o que será daqui para frente. O cenário pode ser ruim se as chuvas vierem agora e pode ser péssimo se as chuvas vierem depois do dia 10 de outubro”, afirma Antônio Pitangui de Salvo.
Em Guaranésia, no sul do Estado, o produtor Caio Rivetti já notou uma queda entre 20% e 30% na produção de leite do seu rebanho devido ao calor excessivo.
“Tenho em torno de 30% dos animais com estresse severo. A gente molha os animais e coloca ventiladores para melhorar a temperatura, mas os animais ainda sofrem”, afirmou.
Segundo o produtor, a temperatura na fazenda durante o dia tem chegado a 37ºC, 7ºC acima da média para o período — baixando para 23ºC à noite.
Com um total de 130 cabeças de gado, sendo 60 em lactação, ele lembra que já iniciou a temporada com uma produção de silagem 40% abaixo do normal devido ao atraso das chuvas. “Estou tendo que comprar comida. Na região está R$ 500 a tonelada para entrega na fazenda. Eu produzindo, sai a R$ 200 a tonelada. É um custo totalmente fora do meu planejamento financeiro”, afirma Rivetti.
Na Cooperativa Central dos Produtores Rurais (CCPR), maior cooperativa de leite do país, que fornece para fábricas da Lactalis, a captação de matéria-prima dos associados deve crescer metade dos 12% inicialmente previstos, segundo Leandro Sampaio, gerente geral de suprimento de leite.
A CCPR tem 25 mil cooperados e uma captação da ordem de 90 milhões de litros por mês. Além do impacto da seca, parte dos associados da central teve a produção afetada também pelos incêndios.
“O maior impacto se dá nas regiões onde os produtores fazem criação extensiva, no norte e no noroeste de Minas Gerais. Os produtores pequenos, com captação de menos de 500 litros por dia, esses tiveram uma redução forte”, diz Sampaio.
Segundo a cooperativa, o volumoso (nome dado à silagem e ao capim oferecido ao rebanho na seca) representa de 30% a 35% do custo de produção. Mas esse custo chega a dobrar para os produtores que perderam pastagem ou silagem e tiveram que comprar alimento de terceiros.
Em Curvelo, região Central de Minas, o pecuarista Thiago Guimarães chegou a ter parte da sua propriedade atingida pelo fogo em julho. Foram cinco dias para conter as chamas nos oito hectares de área de preservação permanente e o principal receio, conta, é não ter água para fornecer aos animais diante da redução de água nas barragens após 150 dias de seca.
“O nosso prejuízo é grande porque, com a nascente secando, o volume de água da fazenda praticamente zerou. A área de irrigação, onde fazíamos plantio de grãos, os pivôs estão parados. Não tem água para irrigar”, afirma Guimarães.