Nesta quinta-feira (25), teve início o seminário “Tocantins na Encruzilhada: Combate ao Desmatamento e Análise Crítica ao REDD+ Jurisdicional”, que acontece até esta sexta-feira (26), no auditório da Reitoria da Universidade Federal do Tocantins (UFT), em Palmas. O evento reúne representantes de movimentos sociais, organizações da sociedade civil, pesquisadores e a comunidade acadêmica para debater os impactos do avanço do agronegócio, o desmatamento, o Programa de REDD+ Jurisdicional e os desafios fundiários no Estado.
O primeiro dia contou com mesa de abertura formada por movimentos sociais e lideranças dos territórios, que relataram os desafios locais dentro da temática, além de exposições de dados e palestras sobre o aumento do desmatamento no Tocantins.
Panorama do desmatamento
Segundo dados do MapBiomas, a região conhecida como Matopiba — que engloba Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia — concentrou mais de 80% do desmatamento do Cerrado em 2024. No Tocantins, o avanço da fronteira agrícola voltada à exportação de commodities coloca o estado em destaque na emissão de gases de efeito estufa e na degradação ambiental.
Paulo Rogério Gonçalves, da ONG Alternativas para a Pequena Agricultura no Tocantins (APA-TO) e representante da Articulação Tocantinense de Agroecologia (ATA), apresentou um panorama da situação ambiental e fundiária: em 2023, o Tocantins perdeu 230,2 mil hectares de vegetação nativa, um aumento de 177,9% em relação a 2022. Além disso, em 2024 foram queimados 2,7 milhões de hectares no território estadual.
Para ele, a crise está diretamente ligada à ausência de políticas públicas de regularização fundiária e ao modelo de desenvolvimento baseado na expansão do agronegócio.
“O Tocantins é hoje o estado com menor transparência em informações sobre terras, segundo o Imazon. O governo prioriza interesses privados e não avança na regularização dos territórios quilombolas, criação de assentamentos rurais e regularização das comunidades tradicionais”, destacou.
O quilombola Lourivaldo dos Santos, coordenador da Coordenação Estadual das Comunidades Quilombolas do Tocantins (COEQTO), ressaltou os entraves da regularização dos territórios quilombolas: das 52 comunidades certificadas pela Fundação Cultural Palmares, apenas a Ilha de São Vicente possui título do território. Outras 13 estão em processo de regularização, enquanto dezenas aguardam providências há quase duas décadas. “Temos uma problemática ambiental e fundiária invisibilizada. O Estado não prioriza a regularização das terras quilombolas, o que agrava conflitos e pressiona ainda mais os territórios”, alertou.
Representando o povo Apinajé, o cacique Joel denunciou que as invasões, o desmatamento e as violências têm avançado sobre os territórios indígenas. Ele também destacou a ineficiência dos órgãos competentes na fiscalização e a falta de consulta prévia às comunidades. “Se não barrarmos o desmatamento agora, nossas próximas gerações não conhecerão o território. Os governos aprovam leis sem nos consultar, ignorando indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais. Continuaremos resistindo, porque pensamos no futuro e na preservação do Cerrado”, afirmou.
REDD+ em debate
A programação do segundo dia será dedicada à análise crítica do Programa de REDD+ Jurisdicional do Tocantins, defendido pelo governo como solução para conter o desmatamento por meio de créditos de carbono. Movimentos sociais, no entanto, denunciam a falta de diálogo com os povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais, além de problemas de transparência semelhantes aos observados em estados como Acre e Pará.
Entre as reivindicações, estão a realização de consulta livre, prévia e informada, conforme a Convenção 169 da OIT, a revogação da Lei Estadual nº 3.525/2019 — que valida registros imobiliários irregulares — e a implementação efetiva da Lei do Babaçu Livre.
Realização
O evento é promovido pelo Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN), pela Coalizão Vozes do Tocantins por Justiça Climática, pelo Centro de Assessoria às Comunidades Tradicionais do Tocantins (CACTTO/UFT), pelo Observatório do Matopiba, pela Articulação Tocantinense de Agroecologia (ATA), pela Coordenação Estadual das Comunidades Quilombolas do Tocantins (COEQTO) e pelo PPGMader/UnB. Conta ainda com o apoio do Fundo Ecos, do WRI e do Instituto Clima e Sociedade (iCS).