O número de empresas ligadas ao meio rural que estão endividadas e recorreram à recuperação judicial continua a crescer. No primeiro trimestre de 2025, 341 companhias do segmento agropecuário estavam em recuperação judicial, aumento de 38% na comparação com o mesmo intervalo de 2024 e de 15,6% em relação ao trimestre anterior, conforme dados do Monitor RGF, desenvolvido pela consultoria RGF&Associados.
O cenário reflete, principalmente, problemas na gestão e ausência de medidas para controle de caixa, afirma o sócio da consultoria, Hugo Cayuela. Apesar do tamanho do setor e da importância gigantesca para a economia brasileira, ainda há o que melhorar em profissionalização dos processos nas empresas.
“A gente vem acompanhando trimestre a trimestre, sabemos que isso é um reflexo da gestão. Quanto mais as pessoas conhecem sobre gestão, maior é a chance de se recuperar”, observa.
Contudo, o especialista acredita que custos de produção elevados, quebras de safras e problemas climáticos nos últimos anos contribuíram para agravar a situação financeira de muitas empresas do segmento.
Ainda assim, Cayuela credita a causa principal das recuperações judiciais à gestão porque, segundo ele, independentemente do cenário de mercado para os produtos agropecuários, a maioria das empresas que consegue sair da recuperação judicial realizou ajustes importantes na gestão financeira.
No Monitor RGF, a categoria “agropecuária” contempla somente as empresas com atividades “dentro da porteira”. A divisão por setores é feita de acordo com a Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) registrada como atividade econômica principal da empresa.
Do total de 341 companhias agropecuárias em recuperação judicial no primeiro trimestre deste ano, a maior concentração de casos era de empresas que fazem cultivo de soja, 124. Havia 68 empresas de criação de bovinos para corte e 43 de cultivo de cana-de-açúcar, entre outras.
Se consideradas as companhias ligadas ao agronegócio, mas que estão inseridas nas categorias “indústria” e “comércio”, o número de empresas em recuperação judicial é ainda maior.
No setor industrial, por exemplo, os dados da RGF mostram que 39 usinas fabricantes de açúcar e 26 frigoríficos de abate de bovinos estavam em recuperação judicial no primeiro trimestre deste ano. Em comércio, 26 vendedoras de defensivos ou fertilizantes encontravam-se na mesma situação.
“O setor sucroalcooleiro tem se destacado pela proporção. A cada mil empresas da agropecuária em atividade, 10,39 estão em recuperação judicial. No setor sucroalcooleiro, esse número chega a 21”, afirma Cayuela.
No segmento de cana, muitas lavouras foram prejudicadas por seca e incêndios em safras anteriores. Fora isso, o especialista ressalta que muitos grupos fizeram investimentos altos que geraram desequilíbrio no caixa.
“Houve dificuldade de reagir a isso e priorizar quais seriam os melhores investimentos, porque muitos precisam de um tempo para dar retorno esperado”, diz, em referência às usinas.
Projeção
Olhando para frente, a expectativa da RGF é de que, ao menos no curto prazo, as recuperações judiciais deferidas continuarão a aumentar no agronegócio
“Vem o evento negativo, depois as empresas sofrem, vem problema de caixa e depois entram em recuperação judicial. É um processo que demora para acontecer. Por isso, as condições melhores da safra de grãos deste ano, por exemplo, não surtem efeito imediato”, afirma Roberta Gonzaga, consultora da RGF, especialista em reestruturação.
Segundo ela, um dos movimentos que podem acontecer nos próximos meses é uma desaceleração do ritmo de companhias entrando em recuperação judicial. Isso porque hoje as empresas de soja estão no topo dos pedidos de proteção contra credores na agropecuária, e as perspectivas são favoráveis para o segmento pela projeção de safra recorde e preços mais favoráveis.
De acordo com a especialista, no primeiro trimestre de 2025 somente duas empresas agropecuárias que estavam em recuperação judicial conseguiram sair e voltaram a operar normalmente no mercado.