A inteligência artificial (IA) está ganhando cada vez mais espaço em diversas áreas de atuação. Na medicina, por exemplo, ela pode ser usada para realizar diagnósticos precoces, antecipar riscos de doenças e pioras em quadro de saúde, além de tornar exames mais precisos. Para incentivar os profissionais de saúde a utilizarem e interagirem com mais facilidade com ferramentas, médicos especialistas criaram um guia de utilização de IA na medicina.
Lançado pela Afya, hub de educação e soluções para a prática médica, o e-book gratuito foi desenvolvido em colaboração com a Microsoft e funciona como um guia detalhado com dicas práticas para que médicos alcancem resultados eficientes com o uso de IA.
“Para que o médico possa tirar o máximo proveito da inteligência artificial, é importante saber como interagir com a ferramenta. A forma como você pede algo à IA influencia a resposta dela. A qualidade da resposta depende da qualidade da pergunta ou do pedido do usuário”, explica Eduardo Lapa, cardiologista, fundador do Afya CardioPapers e um dos autores do material.
O e-book é dividido em cinco partes e é indicado para profissionais que têm pouco ou nenhum contato com a tecnologia. Para auxiliá-los, os três primeiros capítulos são dedicados à conceituação das soluções disponíveis por ferramentas de IA e explicações sobre como acessar e utilizar chatbots.
O material também orienta sobre a geração de comandos e perguntas feitas à IA, por meio de uma metodologia chamada FOCO, que ensina a personalizar os questionamentos de acordo com as necessidades específicas do médico. A partir de informações como características de um quadro de saúde, variáveis envolvidas no cenário e o tipo de linguagem a ser usada, a IA consegue oferecer respostas mais efetivas e condizentes com a situação apresentada.
O último capítulo conta com explicações de como os comandos corretos podem contribuir para extrair conhecimento e conteúdo relevante de materiais densos ou extensos, aplicar a IA na automatização de atividades rotineiras e burocráticas, além de interpretar dados clínicos com eficiência.
“O uso da IA no cotidiano médico já é uma realidade. A tecnologia tem o potencial de ajudar bastante o médico. Quando utilizada corretamente, pode poupar tempo com atividades burocráticas como preenchimento de relatórios e assim permitir que o profissional concentre-se na construção da relação com o paciente. Além disto, pode ajudar o profissional de saúde a buscar referências científicas, reduzir pontos cegos no diagnóstico e tratamento de doenças, entre outras coisas”, explica Lapa.
“Ao criarmos esse guia, pensamos na relevância que a tecnologia tem conquistado no segmento da saúde e construímos uma base de aprendizado que pode ser seguida, aprimorada e trabalhada por toda a comunidade médica, reforçando nosso papel de transformar o futuro da saúde”, afirma.
Uso de IA na medicina é realidade em estudos e iniciativas recentes
O uso de inteligência artificial na medicina é um campo em extensão. Diversas pesquisas já utilizaram algoritmos e aprendizado de máquina para ajudar na detecção precoce de doenças. Pesquisadores do Japão, por exemplo, desenvolveram um modelo de IA capaz de prever o risco de infertilidade masculina com até 74% de precisão sem a necessidade da análise de sêmen. A descoberta foi publicada no jornal científico Scientific Reports no final de julho.
Outro estudo, publicado no mesmo mês na revista eClinical Medicine, mostrou que uma ferramenta de IA desenvolvida por cientistas da Universidade de Cambridge, na Inglaterra, foi capaz de prever se pessoas com sintomas precoces de demência iriam desenvolver ou não Alzheimer.
Segundo a pesquisa, a tecnologia foi capaz de distinguir entre pessoas com comprometimento cognitivo leve e estável e aquelas que progrediram para a doença de Alzheimer em um período de três anos. Além disso, o algoritmo identificou corretamente indivíduos que desenvolveram a doença em 82% dos casos e identificou corretamente aqueles que não a desenvolveram em 81% dos casos.
Ainda conforme o estudo, a IA foi cerca de três vezes mais precisa em prever a progressão do Alzheimer em comparação ao padrão atual de tratamento (marcadores clínicos padrões, como atrofia da substância cinzenta ou pontuações cognitivas, ou diagnóstico clínico).
No Brasil, algumas iniciativas já utilizam IA em procedimentos médicos. Uma tecnologia chamada OncoSeek foi introduzida ao país através de uma parceria entre SeekIn e a clínica FirstSaúde e permite a detecção e o rastreamento de mais de nove tipos de tumores no estágio inicial.
Em estudo realizado com quase 10 mil pacientes — e publicado em julho do ano passado na revista The Lancet — o OncoSeek apresentou uma sensibilidade de 51,7% para todos os tipos de câncer, resultando em uma precisão de 84,3% para a detecção desses tumores. As sensibilidades variaram de 37,1% a 77,6% para a detecção de nove tipos de câncer: mama, colorretal, fígado, pulmão, linfoma, esôfago, ovário, pâncreas e estômago.
Mais recentemente, o Hospital Israelita Albert Einstein deu início a um modelo assistencial que utiliza dados e inteligência artificial para detectar precocemente a piora clínica de pacientes internados em apartamento. O objetivo é reduzir em 50% o número de transferências tardias — ou seja, aquelas em que o paciente precisa receber suporte avançado devido à gravidade do seu quadro de saúde — para o Departamento de Pacientes Graves, ou Unidade de Terapia Intensiva (UTI), nos próximos 24 meses.
Uma solução parecida, desenvolvida pela Lean Saúde, startup especializada no uso de IA para a saúde, promoveu a redução de 13% em eventos adversos graves de pacientes, gerando uma economia média de 11% por internação e redução de 17% na taxa de reinternações. Chamada Lean Stay, a solução realiza o acompanhamento de pacientes internados de alta e média complexidade, levando saúde de qualidade com equidade, sem desperdícios, a fim de assegurar melhores resultados assistenciais e reduzir custos evitáveis.