A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que torna obrigatória a existência do “juiz das garantias” nos tribunais brasileiros completa um ano no fim deste mês. No âmbito da Justiça Federal, cinco dos seis tribunais regionais já se adequaram à determinação, que atribui a esse magistrado a responsabilidade de realizar o controle da legalidade da investigação criminal.
Apenas o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) — responsável pelos estados de Rio Grande do Sul, Paraná e Santa Catarina –, não implementou a mudança, o que, segundo o tribunal, deve ocorrer nos próximos meses.
O TRF-5 publicou em junho uma resolução que trata da implantação e do funcionamento do juiz das garantias em seu âmbito. O modelo, as atribuições e as atuações do magistrado já estão estabelecidos. A resolução entra em vigor no dia 26 deste mês.
Inicialmente, toda essa implementação pelos TRFs deve acontecer até o fim de agosto. No entanto, na aprovação das regras pelo STF, ficou definido que esse prazo pode ser estendido por mais um ano. Portanto, o TRF-4 deverá ter mais tempo.
Na prática, o juiz das garantias cuida do processo — prisões cautelares, busca e apreensão, sequestro de bens, escutas telefônicas e outras provas — sem avaliar se o réu é ou não culpado. Isso é feito em outra fase da ação, por outro juiz.
Cabe ao juiz das garantias, assim que informado da investigação criminal, decidir sobre os pedidos de prisão provisória ou outras medidas cautelares, além de prorrogá-las, revogá-las ou substituí-las; podendo alterar a duração do inquérito; ordenar seu trancamento quando não houver fundamento para sua instauração ou prosseguimento.
É papel do magistrado, quando necessário, requisitar documentos, laudos e informações extras ao delegado de polícia sobre o andamento da investigação e julgar habeas corpus impetrados antes do oferecimento da denúncia.
Assim como na esfera federal, os tribunais de Justiça dos estados e do Distrito Federal também deverão adotar o sistema. Em Goiás, um projeto-piloto começou a ser desenvolvido em março. Há ainda tribunais militares e eleitorais em que o juiz das garantias foi instituído. É o caso de São Paulo.
Livro traz coletânea de textos sobre o assunto
Nesta terça-feira (13), a presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Maria Thereza de Assis Moura, e os professores Pierpaolo Bottini e Gustavo Henrique Badaró, da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), lançaram um livro com coletâneas de ensaios de especialistas sobre o juiz das garantias, em Brasília.
Pierpaolo Bottini ressalta o papel do magistrado para que o segundo juiz, que dará a sentença, dê um peso igual a todas as partes envolvidas. Ele acredita que eventuais dúvidas ou dificuldades serão resolvidas na prática, no dia a dia, inclusive quanto à organização dos tribunais e aos crimes a serem abordados pelos juízes das garantias.
“Como você vai separar, como vai dar atribuição para cada um dos juízes em cada uma das unidades também é outro debate. Quais crimes admitem os juízes de garantia, se essa diferença é uma diferença que a lei faz, mas é uma diferença que na prática também vai acontecer. Então, tem uma série de questões. Todas elas abordadas no livro, que acho que são muito importantes. É só com a aplicação da norma que esses problemas vão aparecer e que a gente vai poder discutir melhor cada uma delas.”
O mecanismo demanda adaptações e os juristas dizem que há uma compreensão sobre o caso. Mesmo assim, Gustavo Badaró considera que a implementação do juiz das garantias poderia estar mais rápida pelo país.
“Não vejo, como em muitos casos se diz, uma grande dificuldade operacional, porque o juiz de uma comarca pode ser juiz de garantias de outra, e vice-versa. O juiz de uma vara, juiz de garantias da outra vara. Então, com um pouco de boa vontade e organização, é possível sem grande dificuldade implementar o juiz das garantias.”
“E depois da pandemia a utilização de processos virtuais e autos eletrônicos se fortaleceu muito”, acrescentou.