Um novo estudo mostrou que o Alzheimer pode ter início precoce e avançar mais rapidamente em pessoas com síndrome de Down. As descobertas, publicadas na revista científica Lancet Neurology no último dia 15, podem ter implicações importantes para o tratamento e cuidados deste grupo vulnerável de pacientes.
O estudo comparou como o Alzheimer se desenvolve e progride em duas formas genéticas da doença: uma forma familiar conhecida como doença de Alzheimer autossômica dominante e a doença de Alzheimer ligada à síndrome de Down.
Para Beau Ances, professor da Daniel J. Brennan Neurology e co-autor sênior do estudo, as descobertas são importantes porque “atualmente, nenhuma terapia para Alzheimer está disponível para pessoas com síndrome de Down”. “Isso é uma tragédia porque as pessoas com síndrome de Down precisam destas terapias tanto quanto qualquer outra pessoa” afirma Ances, em comunicado à imprensa.
Ligação entre Alzheimer e síndrome de Down
A síndrome de Down é uma alteração genética caracterizada pela presença de um cromossomo 21 extra. Esse cromossomo carrega uma cópia do gene APP (proteína precursora de amiloide), o que faz com que as pessoas com essa síndrome produzem muito mais depósitos de amiloide em seus cérebros do que o normal.
Estudos anteriores já mostraram que o acúmulo de amiloide é uma das principais causas da doença de Alzheimer. Para pessoas com Síndrome de Down, o declínio cognitivo característico da doença ocorre, geralmente, aos 50 anos.
Já pessoas com doença de Alzheimer autossômica dominante também têm um cronograma que pode aumentar as chances de declínio cognitivo. Essas pessoas herdam mutações em um de três genes específicos: PSEN1, PSEN2 ou APP. Eles tendem a desenvolver sintomas cognitivos na mesma idade que seus pais: na faixa dos 50, 40 ou, até mesmo, 30 anos.
“Como essas duas populações desenvolvem a doença em idades relativamente jovens, elas não apresentam as alterações associadas à idade observadas na maioria dos pacientes com Alzheimer, que normalmente têm mais de 65 anos”, diz a autora correspondente do estudo, Julie Wisch, engenheira sênior de neuroimagem no laboratório Ances. “Isso, combinado com a idade bem definida de início em ambas as condições, nos dá uma rara oportunidade de separar os efeitos da doença de Alzheimer do envelhecimento normal e expandir a nossa compreensão da patologia da doença.”
Como o estudo foi feito?
Para o estudo, os pesquisadores mapearam o desenvolvimento dos emaranhados de tau, um outro marcador de risco para o desenvolvimento de Alzheimer. Eles realizaram tomografia por emissão de pósitrons (PET) do cérebro de 137 participantes com síndrome de Down e 49 com doença de Alzheimer autossômica dominante. Com isso, foi possível examinar quando os emaranhados de tau apareceram em relação às placas amiloides e quais partes do cérebro foram afetadas.
O estudo mostrou que as placas amiloides e os emaranhados de tau acumulam-se nas mesmas áreas do cérebro e na mesma sequência em ambos os grupos. No entanto, o processo começa mais cedo e é mais rápido em pessoas com síndrome de Down. Além disso, os níveis de tau são maiores para um determinado nível de amiloide.
“A progressão normal do Alzheimer é que você vê amiloide e depois tau – e isso acontece com cinco a sete anos de intervalo – e depois neurodegeneração”, explicou Wisch. “Com a síndrome de Down, o acúmulo de amiloide e tau ocorre quase ao mesmo tempo.”
Atualmente, existe apenas um tratamento para a doença de Alzheimer aprovado pela FDA (Food and Drug Administration), agência reguladora dos Estados Unidos, e que comprovadamente altera o curso da doença: o lecanemab, que tem como alvo a amiloide.
Como o acúmulo de amiloide é o primeiro passo na doença, o lecanemabe é recomendado para pessoas nos estágios iniciais da doença de Alzheimer, com sintomas leves. Também estão em desenvolvimento terapias direcionadas à tau, destinadas a pessoas em fases posteriores da doença, quando a patologia da tau desempenha um papel mais proeminente.
“Como há uma compressão das fases amiloide e tau da doença em pessoas com Alzheimer associado à síndrome de Down, precisaremos atingir tanto a amiloide quanto a tau”, disse Ances. “Podemos precisar encontrar abordagens diferentes para essa população.”
Comentários sobre este post