A corrida de rua cresce em popularidade e tem feito muitas pessoas saírem do sedentarismo com uma atividade física relativamente simples e barata. Segundo dados do aplicativo Strava, a corrida foi o esporte mais praticado no mundo em 2024 e, no Brasil, o segundo país com maior número de atletas, o número de corredores chega a 19 milhões.
Mas, além das dicas básicas de começar em um ritmo mais ameno e aumentar progressivamente, para evitar lesões também é necessário se atentar à alimentação, segundo um estudo recente de revisão sistemática com análise de quase 6000 corredores.
“O trabalho mostrou que uma nutrição adequada é crucial para melhorar o desempenho atlético, auxiliar na recuperação e na saúde geral, o que já tínhamos ciência, mas também mostra uma clara relação entre má nutrição e aumento do risco de lesões, especialmente para mulheres”, explica o médico ortopedista, especialista em cirurgias do joelho e cirurgias do quadril (HSL-RP) e mestre em biomecânica do aparelho locomotor (BIOENGENHARIA) pela Faculdade de Medicina da USP, Fernando Jorge.
“O estudo descobriu que menores ingestões de energia, fibras e gordura estavam fortemente associadas a um maior risco de lesões em corredoras. Quando os corredores não consomem energia suficiente, as necessidades do corpo não são atendidas, o que, com o tempo, pode levar a problemas como desmineralização esquelética, perda de massa corporal magra, fadiga e fraturas por estresse”, completa o médico.
De acordo com a médica nutróloga, diretora e professora da Associação Brasileira de Nutrologia (ABRAN), Marcella Garcez, a preocupação alimentar deve ocorrer antes (para fornecer energia) e depois do exercício físico. “Após o treino, o organismo precisa de macronutrientes específicos para o restabelecimento das reservas de energia, a reparação das fibras musculares lesionadas durante o exercício e a estabilização dos marcadores bioquímicos de estresse causado pelo treino”, explica a médica.
Segundo Fernando Jorge, uma das principais constatações do estudo foi que uma dieta pobre em fibras em corredores pode aumentar a probabilidade de lesões por estresse ósseo tanto em mulheres quanto em homens. “Isso é particularmente interessante e serve de alerta porque um efeito colateral pouco falado das dietas com baixo carboidrato, muitas vezes seguidas por moda e não com orientação de especialistas, reduz o aporte de fibras. E o estudo mostra que corredores lesionados, tanto homens quanto mulheres, consumiram três gramas a menos de fibras por dia em sua dieta, em comparação àqueles que não sofreram lesões”, comenta o ortopedista.
Além disso, Fernando ressalta que os alimentos fontes de fibras geralmente têm origem vegetal e ofertam também micronutrientes, como vitaminas e minerais, além de compostos antioxidantes e anti-inflamatórios.
“As frutas são exemplos de carboidratos complexos, fontes de fibras e micronutrientes como vitaminas e minerais, além de antioxidantes, o que faz delas ótimas opções pós-treino. É importante levar em consideração que as frutas têm grandes variações nas suas composições, portanto é importante conhecer as características de cada uma, para fazer as melhores escolhas para o momento”, reforça Marcella Garcez.
O estudo mostrou que corredoras lesionadas consumiram 450 calorias a menos e 20 gramas a menos de gordura por dia do que as corredoras não lesionadas. Curiosamente, a ingestão de proteínas, carboidratos, álcool e cálcio pelos corredores não influenciou o risco de lesões.
“O estudo avaliou as corridas de longa distância, por isso a gordura teve grande relevância. Ela fornece maior quantidade de energia e de forma mais gradual, por isso dietas que diminuem muito o consumo de gorduras (principalmente insaturadas) podem ser prejudiciais. Além disso, o consumo de gordura, especialmente gorduras saudáveis, é crucial para a absorção da vitamina D no organismo, que é essencial para a saúde óssea. Isso ocorre porque essa vitamina é lipossolúvel, então a gordura ajuda a transportá-la”, comenta o médico.
O ortopedista afirma que os médicos precisam ajudar as corredoras a atingirem ingestão suficiente de energia e gordura, ao mesmo tempo em que orientem todas as corredoras a otimizar seu consumo de fibras. “Uma dieta equilibrada, variada e o mais natural possível, que seja programada de acordo com as necessidades pessoais, é sempre o melhor caminho para garantir o aporte necessário e os melhores resultados”, ressalta Marcella Garcez.