Um novo exame de sangue que utiliza inteligência artificial pode detectar precocemente diversos tipos de câncer. Chamada OncoSeek, a tecnologia permite detecção e rastreamento de mais de nove tipos de tumores no estágio inicial, aumentando as chances de sucesso no tratamento.
Em estudo realizado com quase 10 mil pacientes, o OncoSeek apresentou uma sensibilidade de 51,7% para todos os tipos de câncer, resultando em uma precisão de 84,3% para a detecção desses tumores.
De acordo com o estudo, publicado em julho do ano passado na revista científica The Lancet, as sensibilidades variaram de 37,1% a 77,6% para a detecção de nove tipos de câncer: mama, colorretal, fígado, pulmão, linfoma, esôfago, ovário, pâncreas e estômago. Juntos, esses tumores são responsáveis por 59,2% das mortes globais por câncer anualmente.
Além disso, a tecnologia é capaz de reduzir significativamente a taxa de falsos positivos, aumentando a especificidade (capacidade de o exame detectar o câncer) de 54% para 93%.
A tecnologia foi desenvolvida por Mao Mao, cientista e CEO da SeekIn, e será introduzida no Brasil através de uma parceria com a clínica First Saúde, especializada em detecção precoce e tratamento de câncer.
Como funciona o exame de sangue com IA?
O OncoSeek é um exame baseado em biópsia líquida, conhecido pela comunidade médica como MCED (Multi-Cancer Early Detection), categoria diagnóstica designada para exames com objetivo de detectar precocemente o câncer.
Esse exame é feito através da coleta de cinco mililitros de sangue, em que são analisados sete marcadores tumorais. Posteriormente, um algoritmo desenvolvido especialmente para o exame, treinado por aprendizado de máquina, consegue fornecer a probabilidade de o paciente examinado ter câncer.
“O exame é capaz de detectar se existe ou não existe a possibilidade de câncer naquele momento em que o paciente faz o exame”, explica Raphael Brandão, CEO da First Saúde, à CNN. “O exame detecta célula tumoral circulante no sangue que esteja escondida e que ainda não está macroscopicamente disponível para diagnóstico”, afirma.
No estudo clínico, o exame foi testado em 10 mil participantes, sendo que 7.888 deles não tinham câncer diagnosticado e 2.003 já apresentavam um diagnóstico para o câncer. Os pesquisadores coletaram sangue de cada participantes e quantificaram sete marcadores tumorais.
O algoritmo utilizado no OncoSeek foi desenvolvido para distinguir casos de câncer de casos não oncológicos, calculando o índice de probabilidade de câncer com base na quantificação dos marcadores tumorais e informações clínicas, podendo prever o possível tecido afetado pelo câncer.
“Após testar e treinar esse algoritmo, o estudo aumentou especificidade [do exame], que é a capacidade de detectar quem está doente e ter certeza de que aquilo é um câncer”, afirma Brandão. “Quando se pede exame para identificar marcadores tumorais específicos, de forma isolada, e se observa se deu positivo ou negativo [para a presença desses marcadores], é possível observar uma sensibilidade de 54% de detectar o câncer. Com o algoritmo, essa especificidade sobe para 93%, então ele corrige essa lacuna e isso reduz a possibilidade de falso positivo”, completa.
O exame pode ser feito por qualquer pessoa interessada, mas é indicado, principalmente, para a população com maior risco, como histórico familiar ou herança genética.
Inteligência artificial acelera o diagnóstico precoce
Na visão de Pedro Henrique Araújo de Souza, oncologista clínico e coordenador do Comitê de Tecnologia e Inovação de SBOC (Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica) — que não esteve envolvido no desenvolvimento e testagem da tecnologia — exames MCED, como o OncoSeek, são importantes para permitir a detecção precoce de um tumor em fase inicial da doença, o que aumenta a taxa de cura e auxilia na condução de tratamentos mais específicos, menos agressivos e, ocasionalmente, com menor impacto financeiro.
“A utilização de inteligência artificial permite a avaliação de grandes volumes de pacientes e dos exames destes pacientes, com o desenvolvimento de algoritmos diagnósticos específicos a partir dos dados gerados por esses exames”, comenta Souza à CNN.
De acordo com o especialista, já existem exames de rastreamento, no caso dos tumores de mama, pulmão e colorretal, que mostram que a detecção precoce aumenta a sobrevida média dos pacientes. “Um exame de sangue que realize a detecção precoce pode otimizar esse rastreamento, permitindo selecionar melhor os pacientes que seriam submetidos aos exames de rastreamento e a exames mais invasivos”, explica.
“Nos outros tumores avaliados neste estudo, ainda não existem exames de rastreamento que mostraram aumento de detecção precoce com aumento da taxa de cura desses pacientes. Nesse cenário, esse exame pode indicar quais pacientes devem ter um seguimento mais específico e mais próximo”, completa.
Souza também destaca que os exames realizados em pessoas sem diagnóstico de câncer podem indicar a necessidade de exames complementares, como exames de imagem e outros procedimentos mais invasivos, que confirmem o diagnóstico do tumor. “É fundamental que se minimize a possibilidade de exames falso positivos, o que pode gerar um custo psicológico e financeiro para os pacientes, além de riscos relacionados aos exames diagnósticos”, ressalta.
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