De olho em um eleitorado de trabalhadores autônomos e pequenos empreendedores, que tem participação crescente na economia, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) prepara um conjunto de iniciativas para destravar o crédito a esse segmento.
Uma medida provisória está em elaboração pela equipe econômica, em conjunto com o Ministério do Empreendedorismo, e deve ser encaminhada nos próximos dias à Casa Civil para análise final antes do envio ao Congresso Nacional.
Pelo poder de atrair esse público, que se afastou da esquerda e se aproximou do bolsonarismo nos últimos anos, a medida provisória tem sido chamada de “MP da Reconquista”.
A ideia é trazer na MP uma versão para pequenas empresas e microempreendedores individuais (MEIs) do Desenrola, programa de repactuação de dívidas. E, além disso, novas linhas de crédito no “estilo Pronaf” — uma referência ao financiamento para a agricultura familiar com juros abaixo daqueles praticados pelos grandes bancos
Com a queda de popularidade de Lula, detectada em pesquisas recentes, abrir diálogo com os autônomos e pequenos empreendedores é visto como uma oportunidade política.
Um auxiliar direto do presidente avalia que setores como o agronegócio, evangélicos e militares já têm uma oposição muito consolidada ao PT e à esquerda em geral devido à chamada pauta de costumes.
Mas que no caso dos autônomos e microempresários, o sentimento observado em sondagens encomendadas pelo Palácio do Planalto é de que eles são antipáticos aos governos e ao Estado de forma mais ampla, não especificamente ao governo Lula. Ou seja, podem ser atraídos em caso de melhora econômica.
Na avaliação do Planalto, esse é um público crítico à distribuição de benefícios sociais, que acredita pagar muitos impostos e vê poucas vantagens em programas oficiais do governo federal. O objetivo com a MP é mudar essa percepção.
No caso do novo Desenrola, planeja-se usar o lastro do Fundo Garantidor de Operações (FGO) — algo como R$ 7 bilhões a R$ 8 bilhões — para o refinanciamento de dívidas de empresas registradas no Simples Nacional e de MEIs.
A lógica será a mesma do programa voltado para pessoas físicas, com leilões da dívida em atraso e bancos concorrendo entre si para oferecer o maior desconto na repactuação, esticando prazos e reduzindo os juros praticados.
Já o programa de crédito com juros baixos tem, como objetivo, facilitar a compra de equipamentos e maquinário para os microempreendedores.
O Pronampe, lançado no auge da pandemia de covid-19, tem juros de 6% ao ano mais Selic. Isso chega, atualmente, a cerca de 17% anuais. O governo acredita que as taxas das novas linhas poderão ficar na casa de 10% a 11%.
Isso traria oportunidades de financiamento mais barato, por exemplo, para motoristas de aplicativos que queiram financiar a compra de um veículo próprio ou de pequenos empreendedores dispostos a comprar equipamentos para utilizar na prestação de serviços.
Com o mesmo lastro, do FGO, espera-se alavancar crédito na proporção de R$ 10 para cada R$ 1 disponível no fundo.
O governo acredita que as novas linhas de crédito vão gerar um incentivo também para uma ampliação da base de MEIs.
Hoje o país tem cerca de 15 milhões de microempreendedores individuais, mas muita gente ainda evita registrar-se para não pagar contribuição previdenciária — embora o valor seja baixo. A intenção do governo, com isso, é aumentar a base de arrecadação para o INSS.
Segundo fontes ouvidas pela CNN, a expectativa é que no médio prazo as medidas econômicas possam fazer diferença no eleitorado — em especial na população das regiões Sul e Sudeste, onde estão registrados a maioria dos MEIs e dos micro e pequenos empresários brasileiros.
Selo de bom pagador
Paralelamente, um novo portal do empreendedorismo está sendo pensado para, entre outras coisas, prover avaliação pública de crédito dos MEIs e pequenos empreendedores. A ideia é que eles possam receber uma espécie de “selo de bom pagador” e tenham crédito facilitado.
Esse sistema nasce de uma conversa entre a empresária Luiza Trajano, do Magazine Luiza, e o presidente do conselho de administração do Bradesco, Luiz Carlos Trabuco.
Em uma reunião recente do Conselhobde Desenvolvimento Econômico e Social, em Brasília, Trajano disse para Trabuco que era preciso dar crédito para quem “realmente” precisa no país. E citou os autônomos, MEIs, pequenos empreendedores.
Trabuco, então, respondeu que a dificuldade era avaliar o risco de crédito desses potenciais tomadores. O sistema do governo busca atacar justamente esse ponto levantado pelo “chairman” do Bradesco.
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