A explosão do número de casos de febre oropouche no Brasil tem chamado a atenção de órgãos de saúde. De acordo com o Ministério da Saúde, mais de 7,6 mil casos da doença foram confirmados até o momento em todo território nacional. O número é, pelo menos, nove vezes superior ao total registrado em 2023.
O Amazonas é o estado que concentra o maior número de exames detectáveis para febre oropouche, com 3.228 casos supeitor, seguindo de Rondônia (1.710) e Bahia (844). Chama atenção o número de exames com suspeita e oropouche em Santa Catariana (169), mostrando como a doença deixou de se restringir a zonas tropicais, em especial a região amazônica.
Diante deste cenário, médicos ouvidos pela CNN explicam como diferenciar os sintomas da febre oropouche de outras arboviroses — em especial dengue, chikungunya e zika.
Como diferenciar sintomas da febre oropouche
A febre oropouche é causada pelo vírus Orthobunyavirus oropoucheense (Orov), transmitido a seres humanos principalmente pela picada do mosquito Culicoides paraensis, conhecido como maruim ou mosquito-pólvora. O vírus foi isolado pela primeira vez em 1960 e, desde então, casos isolados e surtos foram relatados.
Via de regra, sabia-se que os sintomas da oropouche são muito parecidos com os de outras arboviroses: febre alta, dor de cabeça intensa, dor muscular, náusea e diarreia. Entretanto, algumas características da oropouche podem ajudar a diferenciá-la de outras doenças.
De acordo com Ralcyon Teixeira, infectologista e diretor da Divisão Médica do Instituto de Infectologia Emílio Ribas, a oropouche pode apresentar:
- dor de cabeça intensa que não passa, em especial na nuca (na dengue, por exemplo, a dor é intensa na região ocular);
- retorno dos sintomas após duas a três semanas (recidiva).
“Os pacientes apresentam o quadro inicial de oropouche e melhoram depois de dois a sete dias. Porém, quando ele está melhorando, pode surgir uma segunda fase da doença”, diz Andrea Almeida, infectologista do Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo.
Erupções cutâneas ou mesmo o amarelamento da pele e dos olhos não são comuns em casos de oropouche. “Na dengue, a erupção cutânea aparece em 50% dos casos; na oropouche esse sintoma é menor, entre 30% e 40%. Os olhos não costumam ficar amarelos, como na febre amarela, e não é comum verificar conjuntivite”, explica Teixeira.
Sintomas da febre oropouche em crianças e grávidas
As crianças devem contar com atenção redobrada, segundo Andrea Almeida, especialmente por não saberem, ainda, explicar exatamente o que estão sentindo. Por isso, é preciso atentar-se aos sinais de irritabilidade em crianças e comportamentos associados. “A criança fica irritada e aí não come. Isso acontece porque a dor de cabeça gera mal estar. Então ela para de se alimentar (ou mamar, no caso dos bebês)”, explica a médica.
Já as grávidas apresentam sintomas muito similares aos de adultos não-gestantes. O que chama atenção desse grupo, porém, é a possibilidade de transmissão vertical — isto é, a transmissão do vírus pela gestante para o feto.
Oropouche causa microcefalia?
De acordo com Maria Paula Gomes Mourão, infectologista e pesquisadora da Fundação de Medicina Tropical Doutor Heitor Vieira Dourado (FMT-HVD), onde lidera o grupo de pesquisa Núcleo de Investigação em Arboviroses, Roboviroses e Viroses Emergentes do Amazonas, a experiência acumulada em casos de oropouche no estado apontava para um tipo de doença de evolução autolimitada e quase sempre sem complicações.
“As formas graves que havíamos identificado, até então, eram de comprometimento neurológico, com quadros de encefalite ou meningite — também de evolução curta e sem sequelas (…) Entretanto, o vírus da oropouche sofreu modificações genéticas ao longo do tempo que podem ter conferido a ele maior capacidade de adaptação a novos mosquitos, maior transmissão e, talvez, maior gravidade”, diz a pesquisadora.
Atualmente, porém, estudos se direcionam para compreender possíveis consequências associadas à febre oropouche, como a microcefalia. É o caso de um bebê do Acre que nasceu com anomalias congênitas e morreu após 47 dias. “Exames realizados nos laboratórios do Instituto Evandro Chagas (IEC/SVSA/MS), em Belém, apontaram a existência de material genético do vírus em diferentes tecidos do bebê que nasceu com microcefalia, malformações das articulações e outras anomalias congênitas”, informa o Ministério da Saúde em nota à imprensa. O caso ainda está sendo investigado para que seja certificada a relação entre oropouche e as anomalias.
“Tudo indica que esse vírus pode ser transmitido verticalmente e causar danos aos fetos, como acontece com o vírus da zika. Ele pode ter tropismo para células neurais, mas isso ainda precisa ser confirmado”, diz Ester Sabino, professora titular do Departamento de Patologia da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP), coordenadora do Laboratório de Parasitologia Médica. A pesquisadora é uma das autoras de estudo internacional preliminar que indica a existência de uma possível nova variante do vírus oropouche.
Como é feito o diagnóstico de oropouche?
O diagnóstico de oropouche não é feito apenas com os sintomas do paciente .“É um diagnóstico de exclusão”, diz Andrea Almeida, infectologista do Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo.
Os médicos ouvidos pela CNN, assim como o Ministério da Saúde, indicam que os sintomas podem ajudar a nortear o diagnóstico, mas sua conclusão é feita a partir da análise em conjunto dos sintomas do paciente, de exames laboratoriais (disponíveis no SUS e laboratórios privados) e do contexto epidemiológico — se a pessoa mora ou passou por um local com foco da doença, por exemplo.
Tratamento, vacina e prevenção
Ainda não existe tratamento específico para oropouche, nem vacina. Os pacientes devem permanecer em repouso, se hidratar e usar medicamentos para alívio dos sintomas, como antitérmicos. Como ainda não se sabe se o vírus pode causar sintomas hemorrágicos, como na dengue, recomenda-se não usar medicamentos como ibuprofeno, ácido acetilsalicílico, diclofenaco, salicilato de sódio, metilsalicilato e os corticoides, que podem facilitar hemorragias.
Sem vacina disponível para evitar a infecção, os principais métodos de prevenção são:
- Se possível, evitar áreas onde há muitos mosquitos;
- Usar roupas que cubram a maior parte do corpo;
- Usar repelentes de mosquitos nas áreas expostas da pele;
- Remover possíveis criadouros de mosquitos, como água parada em pneus, calhas e vasos de plantas, além de manter piscinas e caixa d’águas limpas e tampadas.
O Ministério da Saúde alerta que, em casos de sintomas suspeitos, é recomendado procurar ajuda médica imediatamente e informar sobre sua exposição potencial à doença.