O café preferido dos americanos leva o grão brasileiro. Mas as novas tarifas impostas pelo governo dos EUA colocam em risco este mercado. Se efetivadas, os exportadores brasileiros podem perder bilhões de dólares e, a médio prazo, o consumo de café nos Estados Unidos ficará comprometido. Aumento de custos para a indústria, desemprego na cadeia do café e competitividade em xeque são algumas das principais consequências, para além da balança comercial.
Os EUA são os maiores compradores mundiais de café, com cerca de 24 milhões de sacas consumidas ao ano, e o seu maior parceiro no fornecimento é o Brasil. Segundo dados do Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé), em 2024, o Brasil exportou aproximadamente 8,1 milhões de sacas de café para os norte-americanos, o equivalente a uma receita US$ 2 bilhões. O valor representa aproximadamente 18% do total exportado pelo Brasil para todos os destinos.
“Apesar da importância do café brasileiro na economia consumista americana, não há dúvidas que essa nova tarifa representará um aumento de custos e afetará a competitividade para o café brasileiro frente às outras origens”, diz o diretor-executivo do Cecafé, Marcos Matos.
Apesar das consequências para os produtores brasileiros, o impacto no mercado consumidor dos EUA será mais intenso, acrescenta ele. As tarifas também prejudicam o embarque de cafés solúveis e já industrializados. Segundo o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA), em 2024 o Brasil respondeu por 33% de todas as importações de café realizadas pelos Estados Unidos.
Quanto às variedades importadas pelos EUA do Brasil em 2024, o café arábica em grão representou 82%; conilon/robusta foi responsável por 8,5%; e o restante é completador por café solúvel ou torrado e moído.
“Isso demonstra que há forte dependência dos EUA em relação ao café brasileiro. Além de ser comercializado individualmente, o café brasileiro é fundamental para os blends que a indústria oferece ao mercado consumidor. É o café brasileiro que dá corpo e doçura aos cafés da América Central e Colômbia”, explica Matos.
Pode-se dizer que há uma ligação estratégica entre os dois mercados, a produção brasileira e a indústria americana, acrescenta o representante.
Segundo estudo da NCA – National Coffee Association USA -, o setor de café gera 2,2 milhões de empregos nos EUA e US$ 343 bilhões de faturamento, o que representa 1,2% do PIB norte-americano.
Competitividade
Na análise de Matos, o Brasil enfrentará desvantagem competitiva em relação às taxas impostas a outros países. Para o Vietnã, a tarifa americana é de 20% (inicialmente anunciada em 46%), para a Indonésia é de 32%, para a Nicarágua de 18%, para Colômbia e outros correntes é de 10%. Para o Brasil, com 50% a partir de 1º de agosto, o café importado pelos EUA sairá com custos acima das demais origens.
“Os países exportadores de café para os Estados Unidos estão sendo atingidos por essas barreiras tarifárias (o Brasil fortemente). Isso reforça a perspectiva de que o consumidor americano será um dos mais impactados por essa política governamental americana”, reitera Matos.
Se entrar em vigor no primeiro dia de agosto, as tarifas imporão pressão inflacionária do lado americano. Do lado brasileiro pode haver retração de embarques e consequente redução de divisas, diz Matos.
Haverá substituição do café brasileiro?
Segundo o Cecafé, o grão do Brasil é altamente estratégico para os blends oferecidos aos consumidores. “As características naturais do café brasileiro não são comuns aos cafés de outras origens.
O corpo, a acidez e a doçura do café brasileiro são elementos que não se substituem (pelo menos não de imediato). O paladar dos apreciadores já se moldou a esses elementos na forma em que estão no produto”, argumenta o diretor da entidade.
Com isso, nem Colômbia ou países da América Central seriam capazes de substituir o produto brasileiro, que costuma ser adicionado a essas origens para compor a mistura apreciada pelos americanos.
Os cafés africanos ou da Indonésia também não seriam as alternativas a curto prazo para as indústrias norte-americanas, pois o volume estaria acima da capacidade de oferta, já que são cafés comercializados para a Europa e Ásia majoritariamente e, portanto, não seriam direcionados ao mercado americano.
“Vê-se, portanto, que a substituição do café brasileiro não é algo simples e imediato”, reforça Matos.
Para onde iria o café brasileiro?
Segundo o Cecafé, redirecionar o volume de mais de 8 milhões de sacas exportadas aos EUA não é tarefa fácil, visto se ter os outros mercados já estão consolidados ou abastecidos.
“Países fornecedores, volume comercializado e qualidade (blends) já estão firmados, alterar isso é complexo”, afirma Matos.
Apesar de o mercado chinês estar sendo visto como o destino consumerista do café do mundo e em ascensão, não pode ser entendido como uma “panaceia”.
“É um mercado que vem se consolidando, mas não é um substituto do mercado americano para o café brasileiro. São padrões comportamentais distintos”, explica o diretor.
Ele também lembra que demanda estudos, logística, recursos financeiros, hedges, dente outros fatores precisam ser levados em consideração.