Pesquisadores brasileiros estão usando a visibilidade proporcionada pela 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30) para mostrar ao mundo medicamentos produzidos por recursos naturais da Amazônia, os fármacos naturais. Compostas por bactérias isoladas ou óleos extraídos de frutos do bioma, estas substâncias quando desenvolvidas podem auxiliar no tratamento de câncer, infecções bacterianas, pulmonares e de pele, além de doenças inflamatórias crônicas. O evento climático vai do dia 10 a 21 de novembro.
O Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM) e a Universidade Federal do Pará (UFPA) conduzem esse tipo de estudos e, recentemente, na pesquisa das bactérias isoladas, analisaram micro-organismos presentes no solo de uma unidade de conservação da Amazônia e descobriram que o potencial farmacológico da bactéria desenvolve ações ações anticâncer. O Metrópoles contatou os pesquisadores para saber como funciona a pesquisa.
“Nossa coleta é realizada em campo, com GPS e medição de pH e temperatura. Coletamos apenas 50 g de solo em tubos estéreis ou 1 litro de água, filtrando em filtros de 0,22 µm para reter os microrganismos. O DNA ambiental é extraído e purificado em laboratório, onde será sequenciado por métodos modernos. As bactérias das amostras coletadas são cultivadas em laboratório”, explica Daniela Trivella, pesquisadora do CNPEM.
Daniela ainda explica que, para desvendar o potencial farmacológico das moléculas produzidas por essas bactérias, são usadas técnicas como metabolômica e genômica. Estes métodos conectam as substâncias que as bactérias produzem aos genes, permitindo sua fabricação. Com isso, abre-se a possibilidade de replicar essas moléculas em laboratório.
Com uso de uma tecnologia inédita na América Latina, o sequenciador PromethION, da Oxford Nanoporeo do Reino Unido, permite a análise em tempo real e a leitura direta de DNA, que, com a reação, pode gerar medicamentos. “Esses genes (das bactérias amazônicas) estão associados à síntese de metabólitos, que podem representar novos antibióticos, moléculas com ação anticâncer, e podem levar a tratamentos de doenças ainda sem terapias eficazes”, disse Daniella.Play Video
Óleos extraídos de frutos do bioma e oportunidade de riqueza
As cascas e caroços da pupunha e uxi (frutos amazônicos), geralmente descartados, são coletados e levados ao laboratório. Colocados no reator, os resíduos agroindustriais passam por um processo de extração e pirólise com o auxílio de um centrifuga, se transformando em óleos e bio-óleos ricos em compostos fenólicos, aldeídos, ácidos carboxílicos e cetonas bioativas.
Segundo Marta Chagas Monteiro, coordenadora do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Bioativos da Amazônia (INCT-Probiam) da UFPA, o medicamento pode atuar no tratamento de doenças infecciosas bacterianas e apresenta resultados promissores na cicatrização de lesões de pele.
“Os estudos demonstraram que esses bioativos possuem ações anti-inflamatória, antioxidante, imunomoduladora e antimicrobiana, atuando de forma integrada para reduzir processos infecciosos e oxidativos, modular a resposta imune e acelerar a regeneração tecidual. Esses efeitos foram observados em modelos experimentais de infecção pulmonar, sepse e infecção de pele, entre outros”, afirmou.
Apesar de possuir a maior biodiversidade do planeta, o Brasil apresenta um rendimento menor do que o esperado no mercado global de medicamentos de origem da natureza. O comércio de fármacos naturais é avaliado em mais de US$ 216 bilhões e a participação brasileira neste setor é de apenas 0,1%, segundo o Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar.
A UFPA tenta reverter este cenário com as diversas pesquisas na Amazônia para produção de biofármacos, sendo o óleo de pupunha e uxi somente uma delas. Atualmente, em cima deste estudo a Universidade já fabrica remédios de uso tópico e oral como nanoemulsões, cápsulas e géis cicatrizantes, atraindo interesse internacional e nacional e futuramente, será integrado ao Sistema Único de Saúde (SUS) e tem previsão de ser aprovado pela Anvisa em 2027.
Projetos na COP 30 em prol de uma economia sustentável
O desenvolvimento de biofármacos a partir de recursos da biodiversidade amazônica se conecta com as estratégias ambientais em prol de uma economia de baixo carbono. Fármacos de origem natural promovem a economia sem desmatamento. Os projetos apresentados promovem a bioeconomia, uma das pautas da COP 30.
Tanto Daniela Trivella, pesquisadora do CNPEM no estudo de bactérias isoladas, como a Marta Chagas Monteiro, coordenadora do INCT-Probiam na pesquisa sobre óleo de pupunha e uxi, estarão na COP 30, em Belém, na capital do Pará.
Além destes estudos, os pesquisadores apresentarão outras propostas bioeconômica. As atividades serão realizadas no estande da Associação de Universidades Amazônicas (Unamaz), localizado na Green Zone, uma das áreas que receberá a programação oficial da COP 30. Marta também irá expôr os produtos na Agrozone, outro local que sedia a COP30.







