Nos últimos dois meses, a primeira-dama Janja Lula da Silva tem intensificado a aproximação com o público evangélico, por meio de encontros intermediados pela Frente Evangélica pelo Estado de Direito.
Ao Metrópoles a coordenadora-executiva da Frente, Nilza Valeria Zacarias, descreve as reuniões como um “processo de escuta”, pautado em discussões sobre políticas públicas que afetam, principalmente, mulheres negras e de periferia.
Além da conversa, os encontros são permeados por orações, cânticos e testemunhos de mulheres. De acordo com Nilza, a primeira-dama tem adotado um papel de interlocutora entre o governo e as demandas da população evangélica.
“O povo evangélico é um povo que gosta do diálogo. A gente tem um princípio de irmandade muito forte e irmãos conversam. Ela tem sido muito bem recebida nos espaços dos encontros justamente porque esses encontros falam sobre políticas que beneficiam toda a população”, esclarece a coordenadora da frente religiosa.Play Video
“Em cada encontro são mapeadas necessidades. Quando você faz processos de escuta, seja de mulheres ou dos diversos grupos da sociedade, a intenção é que haja uma devolutiva. Então, cabe à primeira-dama encaminhar essas demandas de acordo com os ministérios e de acordo com as necessidades que são apontadas”, explica.
No último dia 30, Janja esteve em Caruaru (PE), onde participou de uma reunião com mulheres evangélicas. Nas redes sociais, ela descreveu o encontro como “potente”. “Momentos como esse, de escuta e de compartilhamento de vivências, encorajam cada uma de nós para seguir nossos caminhos de cabeça erguida”, disse.
Desde julho foram ao menos cinco encontros do tipo, de acordo com a agenda oficial da primeira-dama. O primeiro ocorreu em 4 de julho, em São Cristóvão, no Rio de Janeiro, com o apoio da ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco. De acordo com a coordenadora da Frente, cada vez mais chegam pedidos de reuniões com a primeira-dama Brasil a fora. O próximo encontro deve ocorrer em novembro.
Veja o cronograma de visitas:
- 4 de julho – Encontro com mulheres da Frente de Evangélicos pelo Estado Direito, em São Cristóvão, Rio de Janeiro;
- 14 de agosto – Encontro com mulheres evangélicas na Igreja Batista Adonai, no bairro de Cajazeiras, em Salvador (BA);
- 20 de agosto – Encontro com mulheres evangélicas na Universidade Federal do Amazonas, em Manaus (AM);
- 27 de agosto – Encontro com Mulheres da Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito na Igreja da Coletivação, em Ceilândia Norte (DF);
- 30 de setembro – Encontro com mulheres da Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito, na Igreja Família Viva, em Caruaru (PE).
Outros acenos
Além das agendas pelos estados, Janja participou de um culto em uma igreja batista durante a viagem a Nova York, no fim de setembro. A igreja escolhida foi a Abyssinian Baptist Church, uma das mais tradicionais entre a comunidade afro-americana do Harlem, onde está localizada.
A primeira-dama também concedeu uma entrevista ao podcast Papo de Crente, da Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito, ao lado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). A conversa foi uma das demandas que surgiu durante as reuniões com mulheres que compõem a Frente. Na ocasião, Janja afirmou que as agendas têm sido importantes para “fazer conexões” com o público religioso.
“Para mim, tem sido um momento de revelação, de me sentir confortável nesses ambientes, e bem acolhida. Tem sido bom a gente conseguir conversar e fazer algumas conexões que talvez não estivessem bem firmes”, disse.
Estratégia
A mobilização junto a mulheres evangélicas ocorre a cerca de um ano das eleições presidenciais. A aproximação é vista por especialistas como estratégica, diante da crescente influência que o grupo tem ganhado nos últimos pleitos.
O cientista político André Cesar aponta que o segmento se aproximou do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) após o impeachment de Dilma Rousseff (PT), em 2016. De acordo com pesquisa realizada em 2024 pelo Instituto de Estudos da Religião (Iser), em parceria com o Nexo Jornal, 67% das entrevistadas declararam voto no líder do PL em 2022.
Para o cientista político, a articulação com evangélicos progressistas é “movimento bom e inteligente”, apesar de representar um grupo minoritário. De acordo com a última pesquisa Quaest, o percentual dos evangélicos que desaprovavam a gestão petista era de 63% contra 34% de aprovação.
“Me parece que esse é um grupo minoritário, mas é uma porta de entrada. É algo que é preciso ser feito, ter esse contato. Esse movimento também é importante porque a primeira-dama faz um contraponto a Michelle Bolsonaro”, avalia.
Ele alerta, no entanto, a necessidade de “calibrar o discurso” para que a aproximação seja mais efetiva. “A Janja, às vezes, é um pouco exagerada nos movimentos dela. Isso pode incomodar os setores mais conservadores que compõe a maioria desses evangélicos. Ela tem que calibrar esse discurso”, pontua.