Biscoitos recheados, refrigerantes, embutidos e refeições prontas já fazem parte da rotina de milhões de brasileiros. De acordo com um estudo realizado pela Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (FSP-USP), cerca de 20% da ingestão calórica dos brasileiros vem de alimentos ultraprocessados.
Apesar de fazerem sucesso entre o público, a ingestão desses produtos pode ser prejudicial para o organismo. Mas, o que exatamente acontece com o corpo em uma dieta de ultraprocessados?
Para a especialista em Nutrição de Precisão, Patrícia Mirisola, a resposta é clara: “Evidências indicam que, a curto prazo, esses produtos podem desregular hormônios da fome e da saciedade, inflamar o corpo e aumentar a expressão de genes ligados à obesidade, diabetes e doenças cardiovasculares. A longo prazo, também podem operar como gatilhos para doenças crônicas”, afirma. O alerta surge a partir do consumo diário desses alimentos.
O que são alimentos ultraprocessados?
De acordo com Patrícia, ultraprocessados são fórmulas industriais feitas de ingredientes refinados com aditivos, como corantes, aromatizantes e emulsificantes. “São criados para imitar e amplificar sabor, textura e aroma de alimentos. Em termos técnicos, podem ser considerados não alimentos, e sim produtos comestíveis”, declara a nutricionista.
É normal se confundir e até mesmo existem alimentos que parecem ultraprocessados e não são. Para ajudar, o Guia Alimentar para a População Brasileira divide os alimentos da seguinte forma:
- In natura: obtidos diretamente de plantas ou de animais (como folhas e frutos ou ovos e leite) e adquiridos para consumo sem que tenham sofrido qualquer alteração após deixarem a natureza;
- Minimamente processados: alimentos submetidos a alterações mínimas, como polimento, moagem, congelamento ou pasteurização;
- Ingredientes culinários: são os extraídos de alimentos in natura ou direto da natureza e utilizados como temperos, para cozinhar os alimentos e fazer as preparações culinárias;
- Processados: são fabricados pela indústria, com a adição de sal ou açúcar e outros ingredientes, como conservas, fermentados, etc.;
- Ultraprocessados: feitos com ingredientes pouco familiares e não usados em casa.
No dia a dia, os ultraprocessados conquistam espaço entre os brasileiros pela praticidade, baixo preço e alta disponibilidade. Eles estão presentes desde o café da manhã, por exemplo, em pães de forma, margarina, cereais açucarados e bebidas lácteas, até em lanches rápidos, como bolachas, salgadinhos e embutidos. O aumento no consumo desses alimentos revela a busca dos brasileiros por praticidade, mas essa escolha pode cobrar um alto preço à saúde.
O impacto dos ultraprocessados no organismo
De acordo com Patrícia, evidências indicam que, a curto prazo, os ultraprocessados podem desregular hormônios da fome e da saciedade, além disso, o alto consumo desses alimentos, pode inflamar o corpo e aumentar a expressão de genes ligados à obesidade, diabetes e doenças cardiovasculares.
“Dietas ricas em ultraprocessados podem favorecer o acúmulo de gordura no fígado. Em pessoas com predisposição genética, esse quadro costuma aparecer mais cedo e evoluir de forma mais agressiva”, afirma a especialista.
Segundo Patrícia, o excesso de açúcar, gorduras ruins e sódio ainda pode alterar a pressão arterial e o colesterol, o que favorece o risco de infarto, principalmente para quem já tem predisposição genética.
“Além disso, aditivos como emulsificantes e conservantes podem alterar o equilíbrio da microbiota intestinal, reduzindo a diversidade de bactérias benéficas. Em pessoas mais suscetíveis à inflamação, isso pode ampliar desconfortos digestivos e dificultar a absorção de nutrientes”, destaca a nutricionista.
Já referente ao sistema imunológico, a especialista pontua que o organismo depende de nutrientes como vitaminas A, C, D e E, além de zinco e selênio, o que mantêm as células de defesa ativas e auxilia a controlar as inflamações.
Nesse caso, quando a dieta é dominada por ultraprocessados, pobres em nutrientes, essa reposição natural fica comprometida e a resposta imune se torna menos eficiente diante de infecções e processos inflamatórios.
Risco de obesidade no consumo de ultraprocessados
O perigo do consumo de ultraprocessados vai além do ganho de peso. Patrícia afirma que muitos produtos vendidos como “fit” ou “zero açúcar” trazem uma armadilha: o uso de adoçantes artificiais. Eles podem condicionar o paladar ao muito doce e influenciar comportamentos de busca por açúcar, atrapalhando a saciedade.
Os componentes artificiais presentes nos ultraprocessados funcionam como “intrusos químicos”: confundem sinais hormonais, competem por vias metabólicas e podem atrapalhar o uso de energia e a resposta à insulina. Os riscos podem ser inúmeros.
“Algumas dessas subtâncias têm capacidade de imitar hormônios da tireoide, bagunçando a sinalização natural que regula o gasto de energia e equilíbrio metabólico”, pontua a especialista.
Ainda, quando esse “ruído químico” se repete todos os dias, o organismo passa a trabalhar de forma menos eficiente, gastando energia para lidar com substâncias artificiais em vez de focar no que realmente importa: manter o metabolismo em equilíbrio.
Como substituir ultraprocessados?
A especialista afirma que há produtos práticos que podem ser aliados no processo de substituição. A atenção aos rótulos é essencial nesse processo:
- Prefira rótulos curtos e claros.
- Desconfie de nomes que você não reconhece como comida.
- Evite produtos em que “açúcar”, “xarope” ou “gordura” aparecem logo no início da lista.
- Priorize alimentos minimamente processados no dia a dia.
- Deixe os ultraprocessados para ocasiões pontuais.
Segundo ela, a ideia não é abolir totalmente os ultraprocessados da rotina, mas usá-los de forma pontual. “O ideal é priorizar alimentos minimamente processados no dia a dia e deixar os ultraprocessados para ocasiões especiais”, destaca.
A praticidade desses produtos pode até facilitar a rotina, mas cobra seu preço silenciosamente no organismo. Escolher alimentos de verdade, ricos em nutrientes e menos dependentes da indústria, é um passo fundamental para preservar a saúde hoje e reduzir riscos no futuro.