O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pediu a seus ministros e auxiliares próximos uma “solução definitiva” para a crise da Avibras.
Uma das mais tradicionais empresas da indústria de defesa, criada em 1961 e com sede em Jacareí (SP), a Avibras está negociando a venda de seu controle para o grupo australiano DefendTex.
De acordo com relatos feitos à CNN por assessores presidenciais, Lula convocou uma reunião sobre o tema na quarta-feira da semana passada (8) e quis ouvir de seus conselheiros o que enxergavam como caminho para a Avibras.
Participaram os ministros da Casa Civil, Rui Costa, e da Defesa, José Múcio Monteiro, o comandante do Exército, general Tomás Paiva, e o presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Aloizio Mercadante.
Quem também esteve no encontro foi o economista Luciano Coutinho, ex-presidente do BNDES entre 2007 e 2016, visto por Lula como uma voz importante na definição de políticas industriais.
Fizeram parte ainda da conversa, no Palácio do Planalto, outros dois ministros: Geraldo Alckmin (Desenvolvimento, Indústria e Comércio) e Luciana Santos (Ciência e Tecnologia).
Auxiliares relataram à CNN o que teriam sido algumas das preocupações do petista em relação ao futuro da Avibras. Ele quer garantir a manutenção dos postos de trabalho, preservar a capacidade de inovação tecnológica da empresa em uma indústria considerada estratégica e livrá-la de vez do risco de fechar as portas.
Críticas
Fundada por um grupo de engenheiros do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), a Avibras foi uma das pioneiras no país na produção de equipamentos bélicos de ponta, como mísseis e lançadores de foguetes.
Hoje a empresa é controlada e presidida por João Brasil Carvalho Leite, filho de um dos fundadores, e está em recuperação judicial. O atual controlador detém 98% do capital.
Com dívidas superiores a R$ 600 milhões e problemas trabalhistas, a Avibras comunicou em abril a existência de “tratativas avançadas” com o grupo australiano DefendTex.
A potencial venda para uma companhia estrangeira tem recebido duras críticas da esquerda, incluindo sindicatos e políticos, que veem a desnacionalização como um desfecho trágico para a crise da Avibras.
O Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos (SP) chamou o negócio de “crime de lesa-pátria”. O ex-senador Roberto Requião (que deixou recentemente o PT) e o ex-presidenciável Ciro Gomes (PDT) condenaram a possibilidade de transferência do controle para uma estrangeira.
O Exército e o Ministério da Defesa, no entanto, encaram esse ponto de forma menos problemática.
Segundo relatos feitos por oficiais militares à CNN, a força terrestre tem cerca de R$ 60 milhões em encomendas à Avibras de produtos que ainda não foram entregues.
Além disso, o ponto alto da parceria da força terrestre com a empresa do Vale do Paraíba gira em torno do Astros — um dos projetos estratégicos do Exército.
O Astros tem como objetivo dotar a força com um sistema de foguetes de artilharia com longo alcance e elevada precisão. A Avibras é parte relevante do programa.
O maior projeto pendente de conclusão pela Avibras é o desenvolvimento do míssil tático de cruzeiro, que permitiria à artilharia do Exército atingir um alvo a 300 quilômetros de distância com erro de no máximo nove metros. Hoje, apenas 11 países do mundo têm essa capacidade.
No entendimento de militares ouvidos reservadamente pela CNN, embora perto da conclusão do programa Astros, é ruim ter uma empresa em situação pré-falimentar lidando com projetos estratégicos das Forças Armadas.
Por isso, minimiza-se a transferência de controle para o grupo australiano. Muitos oficiais do Exército acreditam que o pior cenário é o de quebra da Avibras e atrasos no programa Astros.
Empresa Estratégica de Defesa
Na avaliação do Exército, um ponto que dá mais tranquilidade ao processo é o enquadramento de indústrias do setor como Empresa Estratégica de Defesa (EED).
Companhias classificadas dessa forma se beneficiam com isenção de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e PIS/Cofins. Também podem ganhar licitações do
Ministério da Defesa mesmo com preço até 25% superior ao das concorrentes.
Entre os requisitos para ser uma EED, a empresa precisa ter sede e administração em território brasileiro, além de assegurar sua continuidade produtiva no país.
“O conjunto de sócios ou acionistas e grupos de sócios ou acionistas estrangeiros não [podem] exercer em cada assembleia geral número de votos superior a 2/3 (dois terços) do total de votos que puderem ser exercidos pelos acionistas brasileiros presentes”, diz um trecho da Lei 12.598, sancionada em 2012.
Ou seja: hoje existe um marco legal que desincentiva um grupo estrangeiro a simplesmente adquirir uma empresa nacional e afastar-se do país. Cidadãos brasileiros podem até ter menos ações preferenciais (sem direito a voto), mas ainda precisarão manter fatia relevante nas decisões garantidas por ações ordinárias (com direito a voto).
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