O TJRS (Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul) demitiu, em 3 de julho, a juíza Angélica Chamon Layoun, de 39 anos, da comarca de Cachoeira do Sul, após um PAD (Processo Administrativo Disciplinar) apontar que a magistrada teria usado um mesmo despacho padrão em mais de 2 mil processos, além de promover o desarquivamento irregular de casos já julgados.
De acordo com a decisão, a juíza teria agido com o intuito de aumentar a produtividade.
Angélica tomou posse como juíza substituta em 2022. Desde 2023, ela estava afastada do cargo por conta da apuração do PAD. A magistrada foi demitida porque ainda estava em estágio probatório.
Não há mais possibilidade de recurso no âmbito do TJRS. Por isso, o advogado de defesa da juíza, Nilson de Oliveira Rodrigues, ingressou com um pedido de revisão disciplinar no CNJ (Conselho Nacional de Justiça).
De acordo com a defesa, a penalidade é “desproporcional, juridicamente viciada e carente de prova de dolo ou má-fé”.
Ainda, de acordo com a defesa, o “despacho em lote” é uma ferramenta legal, “que foi criada no processo eletrônico e visa a agilidade da prestação jurisdicional”. Além disso, o próprio TJRS teria orientado a possibilidade de despachos em lote.
“Quando ela fez uma capacitação em Porto Alegre, no Tribunal, que foi, digamos, orientada na possibilidade de despachos em lote, e ela levou isso para o gabinete”, disse Oliveira Rodrigues.
Sobre o desarquivamento irregular de processos já julgados, o advogado diz que tratam-se de processos que tinham sido, equivocadamente, julgados por despacho e não por sentença.
“Estavam julgados e foi dado o nome de despacho. Quando o correto seria sentença. Então, o que ela fez? Ela pegou esse despacho e transformou numa sentença. Ela publicava aquela decisão do processo sem retirar a anterior, mantendo as duas com total transparência. O Tribunal entendeu que ela inseriu dado falso no sistema informatizado. Nós sustentamos que isso não é inserção de dado falso, pelo contrário, é a inserção de um dado verdadeiro”, afirmou.
Além disso, a defesa também aponta que “a juíza enfrentou dificuldades adicionais por ser oriunda de outro estado, mulher e mãe de uma criança de três anos à época, diagnosticada com TEA (Transtorno do Espectro Autista)”.
Confira a nota da defesa de Angélica Chamon Layoun na íntegra:
“A defesa da magistrada Angélica Chamon Layoun discorda da penalidade imposta pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul por considerá-la desproporcional, juridicamente viciada e carente de prova de dolo ou má-fé, elementos indispensáveis à configuração de falta funcional gravíssima.
Como não cabe recurso interno no TJ-RS, foi ajuizado Pedido de Revisão Disciplinar no CNJ, onde se discute a proporcionalidade da sanção e vícios de instrução do processo disciplinar.
A jovem magistrada foi designada para uma vara cível que estava há anos sem juiz titular, com grande passivo processual e sem rotinas estruturadas. Nesse cenário, buscou corrigir falhas operacionais e promover melhorias administrativas, enfrentando resistências internas que acabaram servindo de catalisador para o processo disciplinar.
Além dos desafios próprios de uma unidade desorganizada, a juíza enfrentou dificuldades adicionais por ser oriunda de outro estado, mulher e mãe de uma criança de três anos à época, diagnosticada com Transtorno do Espectro Autista (TEA). A conciliação entre os deveres funcionais e o cuidado com uma criança com necessidades especiais representa um desafio adicional que qualquer mãe magistrada pode compreender.
É importante esclarecer que o que a mídia vem reportando como “sentença” eram, em verdade, despachos que originalmente deveriam ser endereçados para o cartório ou MULTICOM, e não diretamente para os advogados, o que ocorreu por erro de um dos servidores da vara.
Eventuais equívocos ou falhas operacionais, naturais em estágio probatório e agravados pelas dificuldades de adaptação a sistemas digitais complexos, não podem justificar o rigor da medida disciplinar aplicada. A Corregedoria-Geral de Justiça deveria ter priorizado medidas pedagógicas, especialmente quando não há má-fé, dano às partes ou violação da moralidade.
A situação vivenciada pela magistrada Angélica poderia ocorrer com qualquer mulher que enfrente os desafios da dupla jornada profissional e maternal no exercício da magistratura. A defesa confia que o CNJ saberá avaliar o caso com isenção, garantindo o respeito ao devido processo legal e à proporcionalidade da sanção.”
Confira a nota do TJRS sobre o caso:
“Informamos que o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, por meio de seu Órgão Especial, decidiu, por unanimidade, pela demissão de Angélica Chamon Layoun do cargo de Juíza de Direito de Entrância Inicial.
O Processo Administrativo Disciplinar tramitou sob segredo de justiça. Por essa razão, não é possível fornecer acesso ao acórdão ou a quaisquer documentos relacionados à decisão. O TJ-RS reafirma seu compromisso com a ética e a responsabilidade no exercício da magistratura, zelando pela confiança da sociedade no Poder Judiciário.”