Especialistas e parlamentares ligados ao agronegócio criticaram, na quarta-feira (3/9) a proposta do governo, de tributar aplicações financeiras, incluindo os fundos e títulos relacionados ao setor agropecuário. Foi durante audiência para discutir Medida Provisória 1.303, enviada pelo governo federal ao Congresso, que tramita em comissão especial.
A MP tem como tema a cobrança de impostos sobre aplicações financeiras e ativos virtuais. Prevê, entre outras medidas, a cobrança de 5% de Imposto de Renda sobre os rendimentos de Letras de Crédito do Agronegócio (LCA), Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRA) e o Fundo de Investimento nas Cadeias Agropecuárias (Fiagro).
Durante a audiência, o relator da MP 1.303 na Comissão Especial, deputado Carlos Zaratini (PT-SP), disse que pretende apresentar seu relatório no dia 16 de setembro. Caso não haja pedidos de vista, a intenção é votar no dia seguinte.
Para os participantes do encontro, a tributação de aplicações financeiras, conforme o projeto, é prejudicial para o agro e a economia do país. Igor Nascimento, da Associação Paulista de Estudos Tributários, afirmou que o produtor rural precisa de financiamento, e que instrumentos como o Fiagro têm ajudado a reduzir esse custo de capital.
Ele explicou que, quando um fundo é colocado no mercado, tem sua própria estrutura de rendimentos e tributação. Como se trata de um investimento, geralmente, de longo prazo, precisa garantir previsibilidade para ser atrativo. A mudança proposta pela MP 1.303 “acaba com o produto”.
“O dinheiro vai sair do Brasil. O investidor vai fazer o investimento até mesmo no agronegócio de outros países. Essa falta de previsibilidade pode fazer desmoronar o sistema de mercado de capitais criado para o agronegócio, com muito sucesso, em tão pouco tempo”, afirmou.
Fundador da Zera.ag, Otaciano Neto destacou que o crédito rural migrou de forma estrutural do setor público para o privado. O Plano Safra, lançado todos os anos pelo governo, deixou de ser suficiente. Títulos como LCA, CRA e outros instrumentos do mercado ganharam espaço como fontes de recursos para o agronegócio.
Neto lembrou que a LCA responde por uma parte relevante do crédito rural. Citou que, em dezembro de 2024, o estoque de LCA estava em R$ 517 bilhões, com uma exigibilidade de 65% desse total para financiar a agropecuária.
“A tributação da MP coloca em risco um sistema que levou mais de 40 anos para estar funcionando como está. O risco é de desestruturar um setor que anda bem, pouquíssimo dependente do Tesouro”, disse.
Autor da lei que cria o Fiagro, o deputado federal Arnaldo Jardim (Cidadania-SP) afirmou que os títulos do agronegócio surgiram como alternativas ao que chamou de esgotamento do Estado. O parlamentar afirmou que, atualmente, há 650 mil pessoas físicas que investem em fundos agropecuários, com cota média de R$ 15 mil.
“Quando falamos em penalizar esse instrumento, damos um sinal para 650 mil CPF’s, de que vão ter uma frustração de receita”, criticou Jardim, integrante da Frente Parlamentar Agropecuária (FPA).
A bancada ruralista já se mostrou contra a MP 1.303. Na avaliação do colegiado, é uma ameaça à segurança jurídica e ao financiamento privado do setor.
Na audiência da quarta-feira, o presidente da FPA, deputado Pedro Lupion (PP-PR), disse que, ao editar a MP, o governo tem apenas a intenção de arrecadar para sanear as contas públicas. Em sua avaliação, tributar títulos e fundos de investimento no agronegócio é um retrocesso de décadas. “A gente voltaria ao tempo em que dependeria quase que exclusivamente do Estado.”
“A agricultura cresce tanto, que aquilo que o Estado consegue colocar não financia 30% da produção. O resto, tem que ir ao mercado buscar recursos. Quanto mais ferramentas a gente tiver para ajudar o setor produtivo, será bem-vindo, porque alivia o Tesouro”, acrescentou a senadora Tereza Cristina (PP-MS).