Uma conversa entre o líder da China, Xi Jinping, e o presidente russo, Vladimir Putin, repercutiu esta semana após os governantes debaterem transplantes de órgãos e a possibilidade de humanos viverem até 150 anos. O médico Phillip Bachour, presidente da Comissão de Transplante de órgãos do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, responde à CNN se há chances de que isso aconteça.
“Essa ideia de que a gente vai fazer transplantes repetidos e que isso pode alcançar a imortalidade, ou uma vida muito mais longa do que a esperada, é uma ideia fantasiosa, muito longe da realidade. Quando a gente fala de longevidade, se você pegar os centenários, eles habitualmente têm poucas doenças durante a vida. Provavelmente não necessitariam de transplante. São pessoas saudáveis quase toda a vida, adoecem uma vez e falecem próximo desse evento. Diferente de quem tem falência orgânica”, explica Bachour.
De acordo com o médico, a ciência atual pode atestar apenas que pessoas que fazem atividade física regular e têm bom condicionamento, massa muscular e alimentação adequada tendem a viver mais.
“O transplante de órgãos aumenta a sobrevida, mas não no sentido de prolongar a vida indefinidamente. Ele é indicado para pacientes com falência orgânica. Por exemplo, se a pessoa tem falência do fígado, o transplante aumenta sim a expectativa de vida, mas não significa que viverá mais que pessoas sem transplante”, destaca Bachour.
Ele também compara a declaração do chinês sobre humanos viverem até 150 anos com as possibilidades, por exemplo, da existência de carros voadores ou de morar em Marte.
Considerando que experimentos iniciais em xenotransplante — transplante de órgãos de animais em humanos — estão criando possíveis caminhos para salvar vidas, o médico também detalha se isso poderia tornar viável a longevidade citada por Xi Jinping.
“Xenotransplante, por exemplo, já foi aprovado em experimentos pelo FDA, mas ainda é cedo para entender seus impactos. Cada órgão tem sua própria expectativa: rins podem durar décadas, pulmões raramente mais de quatro anos”, diz.
O especialista ressalta que “quando um paciente chega à necessidade de transplante, já está doente há anos, e mesmo com o novo órgão, não volta a ser completamente saudável”.
“Não temos literatura científica que respalde a ideia de transplantes como forma de aumentar a longevidade da população em geral. Eles melhoram a sobrevida de quem já está doente, mas não mudam o panorama populacional”, garante.
A médica Beatriz Furlanetto, especialista em cirurgia cardiovascular pediátrico da BP – A Beneficência Portuguesa de São Paulo, reforçou a ideia de que fora o prolongamento natural que um transplante pode proporcionar ao paciente, “é uma utopia, não faz parte do raciocínio médico e não há nenhuma prova” de que uma pessoa possa viver até 150 anos.
“Realmente muitos estudos têm sido feitos com o xenotransplante, a utilização de um órgão de porco tem sido testado, avaliado para que a rejeição e as infecções relacionadas com a transmissão de infecções para o receptor sejam minimizadas. Esses são estudos que estão em andamento na tentativa de que haja maior oferta de órgãos para as pessoas que necessitam de transplantes”, destacou Furlanetto.
As declarações dos líderes foram transmitidas ao vivo pela emissora estatal chinesa CCTV para outras mídias.