Mais de dois meses depois de se reunirem e anunciarem um grande acordo em torno da execução das emendas parlamentares, a disputa entre os Três Poderes em torno da sua regulamentação só piorou e já ameaça a votação do Orçamento de 2025.
Quem faz o alerta é o próprio relator-geral do Orçamento de 2025, senador Angelo Coronel (PSD-BA): “Existe o risco do Orçamento não ser votado neste ano porque há uma insatisfação grande no Congresso por causa das emendas bloqueadas pelo Supremo. E o Orçamento só pode ser votado com um projeto que regulamente as emendas aprovado”, disse.
De acordo com ele, o bloqueio das emendas determinado pelo ministro do STF Flávio Dino, até que haja uma nova regra para execução, está afetando obras em todo o país.
“A grande maioria são emendas com obras que estavam em andamento. Já há construtoras parando de executar obras por falta de pagamento e o país virando um cemitério de obras por conta disso”, complementou.
O incômodo com a situação foi ampliado nesta semana depois que parlamentares detectaram o dedo do Palácio do Planalto e do Supremo em mais um projeto para regulamentar as emendas.Play Video
Ele foi apresentado pelo deputado Rubens Júnior (PT-MA), vice-líder do governo e um antigo aliado do ministro do STF Flávio Dino no Maranhão, de quem foi secretário de Estado das Cidades e Desenvolvimento Urbano do Maranhão durante o segundo mandato do então governador Flavio Dino entre 2019 e 2022.
O texto do deputado petista apresenta um novo regramento para as emendas parlamentares, mas uma nota técnica informal elaborada por consultores legislativos, que circula entre parlamentares e obtida pela CNN, aponta que, na prática, a proposta esvazia o poder do Congresso na execução do Orçamento:
“Atenção
O PLP 175/2024:
- Acaba com as emendas de bancada(RP02) e veda a elaboração e aprovação de qualquer emenda discricionária.
- Acaba com as prerrogativas dos Relatores Setoriais e da Comissão Mista de Orçamento no atendimento de demandas nas temáticas deles.
- Fixa um teto de R$ 11.5 bi, em um PLP que engessa todos os orçamentos, esvaziando a prerrogativa de debate, remanejamento e alterações no orçamento geral da união.
- Aumenta a prerrogativa de bloqueio, contingenciamento e remanejamento do governo federal, praticamente não será necessária autorização do congresso para alterações durante a execução.
- Acaba com as emendas de apropriação da Comissão Mista de Orçamento.
- Cria regras que inviabilizam as emendas de transferência especial (Pix) impondo as mesmas regras de uma emenda definida.
- Não atende boa parte das demandas do STF e sim pontos do Governo que não foram objeto das decisões do Supremo.
- Veda a destinação de emendas de bancada e comissão para defesa nacional, para atendimento das Universidades Federais e para a Agricultura.”
Procurado, o deputado autor do projeto disse à CNN: “Este projeto nasceu de um grupo de trabalho que teve a participação de membros da Casa Civil, Advocacia-Geral da União, Câmara e Senado dialogando com o Supremo. Então ele não é partidarizado e nem pró-governo. A meu ver, ele vem para destravar todas essas questões e dar transparência na tramitação das emendas parlamentares”.
Na prática, o projeto de Rubens Júnior acaba por rivalizar com outros já apresentados tratando do mesmo tema. Dois deles são iguais e foram apresentados pela deputada Adriana Ventura (Novo -SP) na Câmara e pelo senador Eduardo Girão (Novo-CE) no Senado.
O terceiro foi apresentado pelo próprio relator-geral do Orçamento, que precisa ter um novo regramento de emendas para poder incluí-lo no seu relatório e encaminhá-lo para aprovação do Congresso.
O problema é maior ainda porque sequer a Lei de Diretrizes Orçamentárias foi aprovada. Ela dá as diretrizes gerais para a execução do Orçamento.
Se o Orçamento não for aprovado neste ano, o governo só pode executar as despesas constantes do projeto de lei orçamentária que a Lei de Diretrizes Orçamentárias autorizar.
O problema é que sequer a LDO de 2025 foi aprovada também, uma vez que também aguarda um acordo em torno das emendas.
As últimas vezes em que o Orçamento não foi aprovado no ano anterior ao de sua execução refletiram momentos de intensa crise política, como no governo Dilma Rousseff. A lei orçamentária de 2015 foi aprovada em 20 de abril de 2015 e a de 2016 em 1º de setembro de 2016, quando Dilma já havia sofrido impeachment.