Muitas pessoas, por desconhecimento, acreditam que a perda involuntária de urina é normal com o envelhecimento. No entanto, essa condição que afeta principalmente idosos e mulheres, pode impactar negativamente na qualidade de vida, não é normal e tem tratamento. Levantamento realizado pela Sociedade Brasileira de Urologia (SBU) com dados do Ministério da Saúde apontam que, de 2020 a 2024, foram realizados mais de 29,3 mil procedimentos cirúrgicos para tratar a incontinência urinária.
Em 14 de março, celebra-se o Dia Mundial da Incontinência Urinária, e a SBU realiza ao longo do mês mais uma edição da campanha Saia do Molhado, alertando sobre a necessidade de deixar a vergonha de lado e procurar tratamento para essa condição. Nas redes sociais (@portaldaurologia), posts, lives e vídeos com especialistas esclarecerão as principais dúvidas sobre o tema. Urologistas também participarão de mutirões de cirurgias e de exames de urodinâmicas em diversos estados.
Estima-se que cerca de 45% das mulheres e 15% dos homens acima de 40 anos tenham incontinência urinária. Os escapes podem ocorrer, mesmo em pequenas quantidades, após atividades como espirrar, rir, tossir, exercitar-se e fazer esforços. Ou até mesmo pela vontade súbita de urinar, algumas vezes não dando tempo de a pessoa chegar ao banheiro.
“Muitos pacientes sofrem anos calados com escapes de urina por vergonha de procurar um especialista e acabam recorrendo a soluções como fraldas ou absorventes ou até mesmo recusando o convívio social pelo medo de perder urina em público. Nosso objetivo com a campanha Saia do Molhado é encorajar as pessoas a procurarem um urologista para avaliação e tratamento adequado”, ressalta Luiz Otavio Torres, presidente da SBU.
Cirurgias realizadas no SUS
Dados do Sistema de Informação Hospitalar do Ministério da Saúde levantados pela SBU apontam que nos últimos cinco anos foram realizadas 29.339 cirurgias para tratamento da incontinência urinária, sendo 3.014 por via abdominal e 26.325 por via vaginal.
“A cirurgia realizada por via vaginal é feita através de uma incisão na parede anterior da vagina, sendo menos agressiva e apresentando uma recuperação mais rápida. É a forma preferencial de tratamento, atualmente incisões abdominais são reservadas para casos mais desafiadores, como prolapsos complexos”, explica Alexandre Fornari, coordenador do Departamento de Disfunções Miccionais da SBU.
“Quanto ao número de cirurgias realizadas para tratamento da incontinência urinária no Brasil, quando ajustados pela população e comparados com países mais desenvolvidos, como Estados Unidos e Inglaterra, é muito baixo. Segundo dados de um estudo publicado em 2023 com apoio da SBU, percebemos que fazemos cerca de 15 a 30% do número de cirurgias realizadas em países desenvolvidos. Portanto, temos um número significativo de mulheres incontinentes não tratadas em nosso meio”, completa.
Tipos de incontinência
A incontinência urinária pode ser dividida em três principais categorias:
Incontinência urinária por esforço: é o tipo mais comum, sendo caracterizada pela perda urinária ao fazer esforços como tossir, rir, espirrar, exercitar-se ou carregar peso. Corresponde a cerca de 40 a 70% dos casos de incontinência urinária em mulheres.
Incontinência urinária de urgência: é identificada pela vontade súbita e incontrolável de urinar; é também chamada de bexiga hiperativa.
Incontinência mista: associa os dois tipos de incontinência.
“Com mais de 29 mil cirurgias realizadas no SUS nos últimos cinco anos, a incontinência urinária é uma condição tratável que afeta milhares de pessoas, impactando diretamente sua qualidade de vida, especialmente entre mulheres e idosos. A campanha ‘Saia do Molhado’ busca informar e encorajar o tratamento, destacando que o escape de urina não deve ser normalizado”, destaca Roni de Carvalho Fernandes, diretor da Escola Superior de Urologia da SBU.
Fatores de risco
Entre os fatores que podem influenciar no surgimento da incontinência destacam-se:
- Envelhecimento
- Sexo feminino
- Histórico familiar
- Gestação
- Tabagismo
- Diabetes
- Sobrepeso e obesidade
- Exercícios de alto impacto (quando não há avaliação e acompanhamento adequados)
- Doenças neurológicas como Parkinson e esclerose múltipla
- Cirurgias pélvicas e na próstata (principalmente para tratamento do câncer)
Na terceira idade, a perda de urina está associada ao enfraquecimento dos músculos do assoalho pélvico, diminuição da capacidade de armazenamento da bexiga, aumento da próstata (no caso dos homens), problemas neurológicos, diabetes, ingestão de certos medicamentos etc.
“A incontinência urinária pode ser prevenida ou minimizada com medidas simples ao longo da vida. Para os idosos, a prática regular de atividades físicas para fortalecimento da autonomia física e cognitiva e da musculatura pélvica, hábitos saudáveis – incluindo controle do peso, alimentação equilibrada e consumo adequado de líquidos – são fundamentais. Além disso, evitar tabagismo e tratar condições como diabetes, hipertensão, obesidade e doenças neurológicas, ajudam a reduzir os riscos.
Nos homens, a saúde da próstata deve ser acompanhada de perto, não somente com relação ao câncer, mas também pelo crescimento benigno da glândula (hiperplasia prostática benigna), que costuma causar sintomas urinários, podendo levar à incontinência”, orienta Karin Jaeger Anzolch, diretora de comunicação e coordenadora das campanhas de awareness da SBU.
Já durante a gravidez, a disfunção está relacionada a questões como alterações hormonais, relaxamento dos músculos do assoalho pélvico, crescimento do útero e compressão da bexiga. “Nesse caso, a prevenção passa por um bom acompanhamento médico, fortalecimento do assoalho pélvico com exercícios específicos e controle do ganho de peso. O preparo do corpo para o parto, com orientações sobre a melhor forma de proteger a musculatura perineal, também contribui para reduzir o risco de incontinência no pós-parto. A conscientização e a adoção de hábitos saudáveis são essenciais para manter a qualidade de vida e evitar impactos negativos da incontinência urinária”, alerta Karin.
Tratamento
Quando não tratada, a incontinência urinária pode impactar negativamente no dia a dia, pois a pessoa tende a evitar sair de casa com medo dos escapes.
Atualmente, há diversas opções de tratamento, recomendados de acordo com cada caso. Entre elas destacam-se:
- Mudanças comportamentais, como controle da ingestão de líquido, urinar periodicamente, não fumar, evitar produtos à base de cafeína, tratar a constipação, exercitar-se
- Medicamentos
- Exercícios para fortalecimento do assoalho pélvico (fisioterapia pélvica)
- Estimulação elétrica dos músculos do assoalho pélvico
- Toxina botulínica na bexiga (em casos de bexiga hiperativa)
- Cirurgia para implantação de sling ou esfíncter artificial
Uma nova tecnologia para o tratamento da bexiga hiperativa já vem sendo utilizada com sucesso em outros países e tem previsão de chegar ao Brasil em 2026. Trata-se de um dispositivo implantado no nervo tibial (próximo ao tornozelo) para estímulo crônico da bexiga e controle da incontinência urinária de urgência.
“O tratamento da incontinência urinária é de extrema importância para a melhora da qualidade de vida dos portadores dessa condição, visto que devolve a dignidade, a autoestima e o convívio social a um grupo de pessoas que sofrem em silêncio. Uma das ações mais impactantes e que está ao alcance de todos é incentivar os portadores a procurar ajuda profissional, pois esse gesto simples pode fazer a diferença”, ressalta Alexandre.