O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, afirmou, em café com a imprensa na manhã desta sexta-feira (26/9), que “quem teme ser preso está querendo briga e não pacificação” — em referência ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
O encontro com jornalistas que cobrem a Corte marcou o encerramento do mandato de Barroso na presidência do tribunal. O ministro avaliou que uma das frustrações de gestão foi não ter conseguido a efetiva pacificação do país, principalmente diante dos atos de 8 de Janeiro e das investigações da tentativa de golpe.
“Eu tinha muita vontade de fazer isso e achava que seria possível, mas os julgamentos do 8 de janeiro — o volume, que foi grande, que demorou — e o julgamento do golpe dificultaram muito criar esse ambiente de pacificação total, porque quem teme ser preso está querendo briga e não pacificação. Então eu diria que a minha única frustração foi não ter conseguido fazer a pacificação”, disse Barroso aos jornalistas.
Sobre as sanções impostas contra a maioria dos ministros do STF, como a revogação de vistos, Barroso indicou que a ideia que prevalece entre os magistrados é esperar o fim dos julgamentos de todos os núcleos para avaliar uma reação, seja política ou até mesmo judicial. Ele descartou a possibilidade de deixar a Corte, apesar de ter recebido convites para isso, e afirmou que pretende escrever suas memórias em um livro.
“Nós fomos ao público para tentar desfazer a narrativa que prevaleceu, porque a minha impressão é que prevaleceu, para as autoridades americanas, a narrativa dos que perderam — que tentaram dar um golpe. Essa é a minha compreensão. Eu acho que os fatos — a verdade dos fatos — vêm antes da ideologia. O governo americano pode ter diferenças com o brasileiro — faz parte da vida, da geopolítica internacional, desde sempre. [Mas] Claramente há uma incompreensão do que acontece no Brasil”, disse Barroso.
Barroso, que deixará a presidência do STF para o ministro Edson Fachin — cuja posse será na segunda-feira (29/9) —, lembrou a reação dele ao saber da sanção contra o relator das ações da tentativa de golpe, o ministro Alexandre de Moraes.
“Quando veio a primeira sanção — que foi a tarifa de 50% — eu estava nos Estados Unidos, estava em Boston. E aí eu fiz a primeira nota para dizer que aquilo era produto de uma compreensão equivocada do que havia acontecido no Brasil. Mas preciso dizer que nunca me passou pela cabeça que pudesse vir uma coisa como a [Lei] Magnitsky. Foi uma sanção que elevava o padrão superior de aplicação da lei, como foi dito pelo próprio responsável pela aprovação da lei”, disse Barroso.
O ministro prosseguiu: “O que eu acho é que as autoridades americanas estão convencidas de uma narrativa que não é muito boa — e acho que tem muita gente agora entrando para tentarmos fazer essa narrativa. Porque uma coisa é você apoiar o ex-presidente; outra coisa é você discordar de uma decisão do ministro Alexandre; outra coisa é dizer que no Brasil tem uma ditadura”, pontuou o magistrado.
Julgamento
Barroso comentou o julgamento do ex-presidente na Primeira Turma, que condenou Bolsonaro a 27 anos de prisão, junto a aliados do chamado “núcleo 1”. O ministro destacou que a decisão serve como punição exemplar, para mostrar que, “se fizerem a mesma coisa, vão ser punidas”.
“Portanto, o Direito Penal tem, antes de mais nada, um papel de as pessoas não delinquirem; elas sabem da probabilidade de sofrerem uma consequência negativa, que é a pena. Por isso, esse julgamento é imprescindível para a gente encerrar o ciclo do atraso da história do Brasil, que é uma história de golpes e contragolpes. A gente tinha que julgar para encerrar os ciclos do atraso e as pessoas saberem que, daqui para frente — ao contrário do que sempre havia acontecido —, depois de um delito vem a punição”, disse.
Voto impresso
Barroso citou que uma das decisões mais custosas de sua trajetória na Corte foi ter se posicionado contra a adoção do voto impresso. O ministro observou que, embora não tenha ocorrido em sua gestão como presidente do STF, mas como integrante do plenário, foi necessário enfrentar uma das principais bandeiras defendidas pelo ex-presidente Bolsonaro.
“Primeiro, que tem que transportar esses votos nesse país, que é continental. Segundo: se a gente está lidando com grupos radicais — foram capazes de invadir esta sala aqui no Supremo, o Congresso e o Planalto —, você imagina o que não poderiam fazer nas seções eleitorais em que estivesse sendo feita contagem manual e em que eles achassem que iam perder. Portanto, eu acho que ali se jogou uma cartada decisiva na democracia brasileira”, disse Barroso.