Considerado uma iguaria fina, o aspargo ainda é pouco conhecido e consumido no Brasil. Apesar de ser um ingrediente versátil em pratos de vários restaurantes, sua produção no país enfrenta desafios, especialmente climáticos, que prejudicam o avanço da cultura.
No Brasil, o Censo Agropecuário do IBGE de 2017 – a versão mais recente – aponta que a produção nacional de aspargos era de apenas 49 toneladas anuais. Os produtores com volume significativo da cultura estavam distribuídos, em ordem decrescente de produção, entre Distrito Federal, São Paulo, Paraná, Rio Grande do Sul e Goiás.
Com boa adaptação em climas temperados, a hortaliça é considerada exigente e também limitante, pois depende de colheita manual, em tempos de mão de obra escassa. Além disso, por se tratar de uma cultura perene, exige cuidados na implantação, com boa correção de solo e atenção ao ciclo produtivo.
Esses desafios limitam a expansão do plantio no Brasil. André Azevedo, extensionista rural da Emater Rio em Teresópolis (RJ), comenta que, dos três produtores de aspargos da região serrana do Rio de Janeiro, dois tiveram problemas com a produção nesta safra.
“Um deles teve dificuldade na formação de mudas e o outro teve perda no material, porque o produto não está totalmente adaptado às nossas condições. A região serrana tem um clima tropical de altitude e ainda carecemos de materiais que sejam mais ajustados a esse ambiente”, avalia.
Segundo Azevedo, esse tipo de clima apresenta amplitude térmica, com temperaturas muito baixas e picos de calor. Mesmo sem a intensidade de outras regiões, o calor afeta o desenvolvimento da planta. Por isso, os dois produtores optaram por interromper a produção por enquanto. “A gente tem a intenção de tentar novamente”, afirma.
Também há casos de produtores da região de Petrópolis e de Nova Friburgo que trabalharam com aspargos, mas decidiram paralisar a produção. Outros três produtores do Estado de São Paulo contatados pela reportagem informaram que desistiram de produzir a hortaliça.
Resistência
O Rio Grande do Sul já foi uma das principais regiões produtoras de aspargos no Brasil, entre os anos 1960 e 1970, com clima favorável ao desenvolvimento da cultura comum em áreas frias. Mas no início dos anos 1990, com a importação da hortaliça da China, a produção gaúcha despencou. Hoje, a cultura desafia produtores que tentam investir no cultivo.
O agrônomo Francisco Antônio Arduin de Arruda, hoje aposentado da Emater- RS, empresa pública gaúcha de extensão rural, atuou com assistência à produção da hortaliça em meados de 1990. “Em Pelotas, o aspargo tinha um poder, era uma coisa fabulosa”, recorda.
No entanto, a competição com o produto importado destruiu o mercado do aspargo gaúcho. Sem ter para quem vender, os produtores foram substituindo a cultura por outras opções. “Tentamos de tudo para convencer a indústria a não parar”, recorda Arruda.
A agricultora Rosani Schuch Voigt, de Pelotas, foi a única que manteve a produção na região. O aspargo faz parte da história da família há quase 60 anos. “Sou filha de produtor de aspargo, eu me criei dentro da lavoura. É muito triste ver uma cultura que era tão forte praticamente desaparecer. Hoje sou a única e o aspargo está em extinção por aqui”, lamenta.
Há 22 anos, ela comprou a área que pertencia ao pai e, para manter a atividade, montou uma agroindústria familiar – a Frutos da Terra – para a produção do aspargo em conserva. Na última safra, colheu 2 mil quilos de aspargos. Na agroindústria, a produção gira em torno de 4 mil vidros de conserva por ano. Por ser uma hortaliça delicada, exige cuidado na colheita e na elaboração do produto para o envase. Segundo Rosani, as perda no processo giram em torno de 35% da produção.
No campo, o cultivo requer atenção com a adubação e controle de pragas e doenças, além de transporte adequado para manter a qualidade. “É fundamental contar com assistência técnica especializada para não entrar mal. A plantação dura por aproximadamente dez anos”, orienta Arruda.
A hortaliça precisa de frio para induzir a dormência da planta e um período quente para o brotamento. “As mudanças climáticas e a mão de obra para colheita têm sido os maiores desafios para o cultivo”, explica Rosani.
Arruda considera o aspargo uma cultura bem interessante, mas não vislumbra um retorno com a intensidade anterior para a região. “Vejo nichos que podem ser explorados, mas é preciso incentivo aos produtores”, resume. Ele destaca que uma geração foi perdida, uma vez que os filhos dos produtores gaúchos de aspargos hoje atuam com outras culturas como soja, canola e trigo. “São lavouras mecanizadas, que diminuem a penosidade para os agricultores”, avalia.
Ele lembra que o aspargo, que apresenta boa adaptação em climas temperados, é uma cultura exigente e também limitante, pois depende de colheita manual, em tempos de mão de obra escassa. Além disso, por se tratar de uma cultura perene, exige cuidados na implantação, com boa correção de solo e atenção ao ciclo produtivo.
Comercialização
Na Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (Ceagesp), a comercialização do aspargo nacional apresentou aumento de 60% entre os anos de 2023 e 2024. Segundo João Gabriel Alves da Costa, analista de economia da Seção de Economia e Desenvolvimento da Ceagesp, os principais municípios brasileiros fornecedores de aspargos dos atacadistas são Marialva (PR), Pilar do Sul (SP) Vargem (SP) e, em menor escala, Mogi das Cruzes (SP).
A maior parte do produto adquirido pelos permissionários da Ceagesp, entretanto, vem do exterior. Das 316,27 toneladas de aspargos comercializadas em 2024 no local, 164,33 toneladas ou 62% vieram dos Estados Unidos, seguido pelo Peru, com 80,98 toneladas ou 25,6%. A demanda é destinada, principalmente, a restaurantes e supermercados.
Outro dado que mostra o desenvolvimento da cultura no Brasil são as exportações do produto. Entre 2019 e 2024, a exportação de aspargos frescos ou refrigerados no Brasil passou de 19,7 toneladas para 78,7 toneladas, um aumento de 297,9%. Os dados são do sistema Comex Stat, do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, e foram compilados pela Apex Brasil.
Informações do sistema Agrostat, do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa), elaborados pelo Departamento de Economia Rural (Deral) da Secretaria da Agricultura e Abastecimento do Paraná (Seab) e com metodologia distinta do Comex Stat, mostram que Rio de Janeiro, com 2,29 toneladas, e São Paulo, com 1,89 tonelada, foram os estados que mais exportaram aspargos em 2024. Em seguida, estão Santa Catarina (1,70 t) e Paraná (0,39).
No ranking mundial de produção de aspargos, conforme a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), a China está na liderança da produção. Em 2023, o país asiático produziu 7,44 milhões de toneladas do legume, seguido do Peru (356.729 toneladas,) do México (347.291) toneladas e da Alemanha (111.900 toneladas. A produção global passou de 8,5 milhões de toneladas, com crescimento de 407% em relação ao ano anterior. Segundo dados da Agrostat, os brasileiros importaram o produto, em 2024, principalmente do Peru (841 toneladas).