A primeira semana da Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP30), que ocorre em Belém (PA) desde o dia 10 de novembro, terminou com um retrato misto: passos curtos em alguns temas, bloqueios nos pontos mais sensíveis e sinais de que as próximas rodadas de negociação serão decisivas para definir a ambição climática mundial até 2030.
Entre adaptação climática, financiamento, transição justa e o delicado debate sobre combustíveis fósseis, o clima é de cautela. Com a saída das equipes técnicas e a entrada das equipes políticas de negociação à mesa, começa, agora, a fase em que decisões precisam ser tomadas.
Os debates, entretanto, ganham novo fôlego nesta segunda semana, com o retorno do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a Belém, nesta quarta-feira (19/11), “em um esforço conjunto para fortalecer a governança do clima e do multilateralismo” e destravar a reta final das negociações.Play Video
A divulgação, pelo Brasil, do primeiro rascunho do chamado “texto do mutirão” — um documento que tenta amarrar os quatro temas que hoje travam a conferência: financiamento climático, transparência, comércio e a revisão das metas nacionais para a redução de emissões de gases de efeito estufa (NDCs) —, nessa terça, também promete pressionar as delegações.
Adaptação climática esbarra em financiamento
Adaptação climática é o conjunto de ações que ajudam países, cidades e comunidades a lidar com os impactos já inevitáveis da crise climática — como secas prolongadas, enchentes mais intensas, calor extremo, perda de safras, avanço do nível do mar e aumento de doenças sensíveis ao clima.
O Global Goal on Adaptation (GGA) – Objetivo Global de Adaptação, em português – é uma meta estabelecida pelo Acordo de Paris para orientar o mundo sobre como aumentar resiliência e reduzir vulnerabilidades frente à crise climática.
Ele funciona como uma bússola: define o que os países devem fazer para se preparar, se adaptar e proteger populações diante dos impactos presentes e futuros. Mas, ao contrário de mitigação climática— que tem metas claras, como limitar o aquecimento a 1,5ºC —, a adaptação é mais difícil de medir.
Por isso, desde 2021, os países negociam como transformar o GGA em algo mensurável, verificável e comparável. Com esse objetivo foram criados os indicadores, que tentam responder, na prática, se um país está mais preparado para os impactos da crise climática. Eles funcionam como termômetros da adaptação.
A primeira semana da COP30 elevou a lista de indicadores para 114, distribuídos em áreas como sistemas de alerta precoce, segurança hídrica, saúde, infraestrutura, proteção de ecossistemas, planejamento urbano, financiamento, governança da adaptação.
Apesar dos avanços técnicos, os países ainda divergem sobre indicadores de meios de implementação – isto é, como medir se existe financiamento, capacidade institucional e apoio técnico suficiente para que a adaptação aconteça.
É justamente nesse ponto que as negociações emperraram na primeira semana da COP30.
Balanço Global emperra na discussão sobre fósseis
O Balanço Global, uma espécie de “boletim escolar do planeta”, é feito a cada cinco anos para avaliar se os países estão cumprindo o que prometeram no Acordo de Paris. Ele reúne dados, análises e recomendações sobre tudo o que precisa ser feito para limitar o aquecimento global.
Na teoria, o processo funciona como um grande check-up climático. Na prática, porém, o relatório emperrou ao esbarrar na discussão sobre carvão, petróleo e gás — justamente os combustíveis que mais contribuem para o aquecimento da Terra.
Isso porque alguns países defendem uma redução rápida e clara do uso dessas fontes de energia, já outros, que dependem economicamente dos fósseis, resistem a qualquer linguagem que pareça exigir cortes mais firmes.
A proposta da coalizão Associação Independente da América Latina e do Caribe (Ailac) defende um escopo amplo para o próximo Balanço Global, sem ligação direta com as metas de cada país para reduzir emissões de gases de efeito estufa e se adaptar às mudanças climáticas.
Ao mesmo tempo, Índia, Arábia Saudita, Catar e China continuam barrando qualquer avanço que aponte para resultados concretos, sobretudo aqueles que mencionam eliminação de combustíveis fósseis.
Formato, cronograma e metas seguem sem definição na primeira semana de COP. Sobre o segundo Balanço Global, só houve acordo sobre procedimentos — nada de consenso em prazos, referências ao Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) ou inclusão de áreas temáticas.
Transição justa e proteção a grupos vulneráveis
Quando se fala em “transição justa” diz respeito em sair de um mundo que depende de carvão, petróleo e gás para outro que usa energia limpa, como solar e eólica.
Pela primeira vez nas negociações internacionais sobre clima os termos “combustíveis de transição” e “subsídios ineficientes aos combustíveis fósseis” aparecem nos textos — um marco simbólico que abre espaço para debater a eliminação gradual dos fósseis e dos incentivos que os sustentam.
O novo rascunho do Programa de Transição Justa (JTWP) reforça salvaguardas para grupos vulneráveis, incluindo povos indígenas, mulheres, jovens, afrodescendentes, trabalhadores informais e pessoas com deficiência.
Negociadores veem essa ampliação como crucial para garantir que a transição não aprofunde desigualdades.
Financiamento para adaptação
O Fundo de Adaptação é um tipo de “caixa” internacional de recursos para que países mais afetados pelas mudanças climáticas possam se proteger de enchentes, secas, queimadas, ondas de calor e outros impactos que já estão acontecendo.
Na COP30, os países estão discutindo como esse fundo vai receber dinheiro através do mercado internacional de créditos de carbono, previsto no Acordo de Paris. esse sistema, cada crédito de carbono vendido deve repassar automaticamente uma pequena parte do seu valor para o Fundo.
Entretanto, para liberar essa verba, é preciso fazer uma “transição”: ajustar regras, documentos e modos de funcionamento.
Na primeira semana de negociações todos concordam que o Fundo de Adaptação precisa fazer essa transição de forma suave e organizada, ou seja, ninguém é contra continuar o processo.
O travamento aparece quando os países discutem o que deve ser resolvido agora e o que pode ficar para depois. O impasse político.
Países africanos, nações muito pobres e parte da América Latina querem avançar primeiro nos ajustes técnicos — as regras práticas que permitem ao Fundo acessar esse dinheiro — e deixar questões políticas, como nomes oficiais e quem fará parte do Conselho que vai comandar o Fundo, para um momento posterior.
Já União Europeia, Reino Unido e Austrália defendem que essas definições políticas fazem parte da própria transição e precisam ser resolvidas agora.







