Um novo estudo constatou que alimentos e bebidas com corantes sintéticos contêm, em média, 141% mais açúcar total do que produtos sem corantes sintéticos. Já o sódio e a gordura saturada foram menores nos alimentos com corantes, de acordo com o estudo publicado na quarta-feira (25) no Journal of the Academy of Nutrition and Dietetics.
Os resultados indicam que os corantes alimentares sintéticos podem ser considerados um “alerta vermelho” para produtos que tendem a ser menos saudáveis no geral, segundo David Andrews, diretor científico interino do Environmental Working Group, uma organização sem fins lucrativos de defesa da saúde e do meio ambiente. Andrews não participou do estudo.
Recentemente, os corantes alimentares sintéticos tornaram-se um alvo importante na cruzada para reduzir doenças crônicas e problemas neurocomportamentais nos Estados Unidos.
A Califórnia começou a abrir caminho para legislações contra corantes sintéticos à base de petróleo há alguns anos, com base em preocupações de saúde que incluem um risco potencial aumentado de câncer e problemas neurocomportamentais em crianças e animais.
O governador Gavin Newsom baniu o corante vermelho nº 3 em 2023 e outros seis corantes comuns dos alimentos escolares em 2024. Desde então, outros 25 estados seguiram os passos da Califórnia com legislações — algumas já sancionadas, outras ainda em andamento — que preveem banir, restringir ou exigir rótulos para corantes alimentares.
Alguns legisladores estaduais foram inspirados pelo escrutínio sobre corantes alimentares artificiais promovido pelo movimento “Make America Healthy Again” (“Torne a América Saudável Novamente”), lançado pelo secretário de Saúde e Serviços Humanos dos EUA, Robert F. Kennedy Jr. A Administração de Alimentos e Medicamentos dos EUA (FDA) anunciou, em abril, planos para trabalhar com a indústria na eliminação gradual do uso de corantes sintéticos derivados de petróleo no abastecimento alimentar.
Mas especialistas ressaltam que é importante que legisladores e o público se lembrem de que os corantes são apenas um dos componentes dos alimentos ultraprocessados altamente manipulados.
“Remover os corantes alimentares sintéticos não transforma automaticamente esses produtos em alimentos ou bebidas saudáveis”, afirma por e-mail Jennifer Pomeranz, professora associada de políticas e gestão em saúde pública da Escola Global de Saúde Pública da Universidade de Nova York.
Os problemas persistentes dos alimentos ultraprocessados
Assim como muitos legisladores contrários aos corantes, a autora principal do estudo, Elizabeth Dunford, diz que seu interesse na pesquisa foi motivado por uma “curiosidade pessoal e profissional”.
“Sou mãe de duas crianças pequenas — de 7 e 5 anos — e percebo claramente mudanças comportamentais, especialmente no meu filho, após consumir produtos com açúcar e corantes sintéticos”, afirma Dunford, consultora da divisão de políticas alimentares do George Institute for Global Health. “Mas também minha principal linha de pesquisa profissional é avaliar a saudabilidade dos alimentos disponíveis, com foco específico em perfil nutricional e uso de aditivos.”
Alimentos ultraprocessados compõem até 70% da oferta alimentar dos EUA e são produzidos com técnicas industriais e ingredientes “nunca ou raramente usados em cozinhas”, segundo a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO). Esses alimentos tendem a ser pobres em fibras e ricos em calorias, açúcar adicionado, grãos refinados e gorduras, sódio e aditivos — todos voltados a tornar os produtos mais atrativos.
Os aditivos incluem conservantes para manter frescor e textura ou evitar mofo e bactérias, além de emulsificantes para impedir a separação natural dos ingredientes. Também são comuns os aromatizantes, realçadores de sabor e agentes antiespumantes, branqueadores, de volume, gelificação e brilho.
Diversos estudos publicados nas últimas décadas associaram o consumo de ultraprocessados a doenças e problemas de saúde, incluindo diabetes tipo 2, doenças cardiovasculares, obesidade, morte precoce, câncer, depressão, declínio cognitivo, AVC e distúrbios do sono.
Os riscos para algumas dessas condições podem surgir com apenas uma porção diária de alimentos ultraprocessados, segundo vários estudos. Por isso, alguns estados que propuseram ou aprovaram leis sobre corantes também incluíram outros aditivos populares, como óleo vegetal bromado e propilparabeno.
É também por isso que especialistas alertam contra o consumo desses alimentos, mesmo que usem corantes naturais — uma tendência crescente diante da pressão federal e estadual. O governador do Texas, Greg Abbott, sancionou no domingo uma lei inédita que exige rótulos em alimentos e bebidas que contenham 44 corantes ou aditivos.
Além disso, a Kraft Heinz vai eliminar os corantes sintéticos dos cerca de 10% de seus produtos vendidos nos EUA que ainda os contêm até o fim de 2027. A Nestlé afirmou à CNN que fará o mesmo dentro de um ano.
“O percentual de produtos com corantes sintéticos é bem menor do que o de produtos ultraprocessados; portanto, as cores naturais que permitem o consumo excessivo de ultraprocessados também são um problema”, diz por e-mail Jerold Mande, CEO da Nourish Science, uma ONG focada nas crises nutricionais dos EUA. Mande não participou do estudo.
A prevalência de alimentos com corantes artificiais
O objetivo principal do novo estudo liderado por Dunford foi medir o uso de corantes sintéticos em 39.763 alimentos e bebidas vendidos pelas 25 maiores fabricantes dos EUA, com base em dados de 2020 da Label Insight, empresa da NielsenIQ.
Até 19% dos produtos — quase 1 em cada 5 — continham entre um e sete corantes sintéticos, descobriram os pesquisadores. O corante mais usado foi o vermelho nº 40, seguido pelo vermelho nº 3 e pelo azul nº 1.
As categorias com maior uso de corantes foram bebidas esportivas (79%), concentrados para bebidas (71%) e confeitaria (54%). “Refrigerantes representaram a maior proporção das vendas totais de produtos com corantes sintéticos (30%), por ser a categoria de maior volume”, escreveram os autores.
Alguns fabricantes apontaram que mudanças no mercado desde 2020 podem ter impactado os percentuais atuais. Ainda assim, os corantes seguem sendo parte significativa do sistema alimentar, e muitos desses produtos ainda estão à venda.
Em certa medida, o estudo “ainda fornece um bom retrato do cenário, já que grandes empresas geralmente levam 18 meses para mudar sua cadeia de suprimentos e reformular produtos”, diz Mande, que também é professor adjunto de nutrição da Escola de Saúde Pública Harvard T.H. Chan.
A pesquisa também fornece uma linha de base para mudanças, considerando o foco nacional na remoção de certos corantes do abastecimento alimentar — especialmente nas escolas, segundo Pomeranz, que não participou do estudo.
“É fundamental que agências reguladoras continuem priorizando pesquisas revisadas por pares e relevantes para a saúde e segurança humana”, afirma por e-mail Sarah Gallo, vice-presidente sênior de políticas de produto da Consumer Brands Association. A associação representa a indústria de alimentos.
“Além disso, a indústria investiu em ferramentas de transparência para o consumidor, como o SmartLabel e o Facts up Front, para que as famílias possam consultar os ingredientes e informações nutricionais dos produtos e tomar decisões que considerem melhores para si”, completa Gallo.
Reduzindo o consumo de corantes na alimentação
Pessoas preocupadas com corantes alimentares e ultraprocessados devem, na medida do possível e de acordo com seus recursos financeiros, optar por alimentos in natura e bebidas sem adição de açúcar, recomenda Pomeranz.
Aumente o consumo de frutas e vegetais frescos, grãos integrais, castanhas, sementes e leguminosas. Também é importante estar atento à ingestão de sódio e a como determinados alimentos afetam seu bem-estar — ultraprocessados costumam causar vontade de comer mais, enquanto alimentos naturais são mais saciantes.
Leia os rótulos dos produtos ao fazer compras, aconselham os especialistas. “Uma coisa que me surpreendeu foi a presença de corantes sintéticos em produtos em que eu não esperava encontrá-los — como pães de cachorro-quente simples, tacos, bagels, waffles etc.”, diz Dunford, professora assistente adjunta no departamento de nutrição da Universidade da Carolina do Norte, em Chapel Hill.
Alguns especialistas argumentam que, para melhorar realmente a saúde da população, é preciso um foco maior em tornar alimentos saudáveis mais acessíveis.
Ainda assim, o movimento MAHA “colocou as doenças crônicas causadas pelos alimentos ultraprocessados como prioridade política. Isso muda o jogo das políticas públicas”, diz Mande. “Focar nas cores é um primeiro passo razoável para desestabilizar o modelo de negócios baseado em ultraprocessados.”
Mas “o MAHA vai precisar enfrentar os ultraprocessados de forma mais direta — por exemplo, limitando seu uso nas refeições escolares — para alcançar melhorias reais na saúde infantil”, completa.