Além da MP (Medida Provisória) com auxílio financeiro para os empresários, o governo também aposta em outra frente para combater – ou ao menos mitigar – os efeitos do tarifaço de Donald Trump: novos acordos comerciais e diversificação de mercados.
A intenção do Brasil não é substituir integralmente o mercado americano, algo considerado impossível devido à complexidade das cadeias produtivas e ao tamanho do mercado consumidor dos EUA, mas diversificar destinos para minimizar os impactos.
No documento de apresentação do plano, o governo destacou que o objetivo do Brasil, nesse momento, é buscar a assinatura de novos acordos comerciais do Mercosul com grandes blocos econômicos ou ampliar os vigentes.
O documento cita, por exemplo, a recente conclusão das negociações do bloco para o acordo de livre comércio com o Efta, grupo de países europeus formado por Suíça, Noruega, Islândia e Liechtenstein.
O acordo prevê compromisso de liberalização tarifária em setores industriais e agrícolas, respeitando as especificidades de cada mercado.
Outro foco do Brasil, citado no plano, é ampliar a cobertura – hoje bem limitada – do acordo de comércio preferencial da Índia com o Mercosul.
Lula, após ligação com o primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, afirmou que o país concordou com a ideia.
O governo brasileiro avalia que a Índia, o país mais populoso do mundo e que passou por um processo de industrialização nas últimas duas décadas, ainda é pouco explorada pelos exportadores nacionais.
O governo vê margem para ampliar as vendas de produtos como óleos vegetais, algodão, feijões e pulses, etanol, genética bovina e frutas. Correndo por fora, estão carne de aves, pescado, café e suco de laranja.
Hoje, apenas 14% das exportações brasileiras para a Índia estão cobertas pelo acordo. O tratado, de alcance limitado, abrange 450 categorias de produtos, num universo de cerca de 10 mil, e prevê reduções tarifárias modestas, entre 10% e 20%.
Paralelamente, o governo busca a abertura de novos mercados e diversificação das exportações.
Esses mercados alternativos já vinham sendo mapeados antes mesmo do tarifaço de Donald Trump, o que facilitou o trabalho do governo, que já contava com um cardápio de opções quando a tarifa foi anunciada.
Esse discurso ganha ainda mais relevância para produtos e commodities agrícolas. A diversificação é uma das prioridades do Ministério da Agricultura e Pecuária desde o início do terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Desde 2023, foram abertos quase 400 novos mercados.
Alguns produtos que não foram incluídos na lista de exceções das tarifas já contam com algumas alternativas aos olhos do governo federal.
No caso do café, as autoridades apontam China e Índia como destinos estratégicos. Embora o consumo de café ainda não seja tradicional nesses países, ambos apresentam forte crescimento da demanda e são grandes mercados consumidores em potencial.
No último dia 2, a China autorizou 183 empresas brasileiras a exportar café para o país.
Para a carne bovina, o governo vê a Arábia Saudita como um destino possível.
Em 2024, o país importou cerca de US$ 487 milhões em carne bovina desossada congelada, um mercado em crescimento desde 2020. Os maiores fornecedores são Índia (US$ 197 milhões), Brasil (US$ 149 milhões) e Austrália (US$ 73 milhões).
O Brasil se destaca na Arábia Saudita por ter 140 estabelecimentos habilitados pela autoridade sanitária local, o maior número entre os exportadores. O governo brasileiro estima um potencial adicional de exportação para a Arábia Saudita de cerca de US$ 54 milhões por ano.
Vietnã e Singapura também são vistos como mercados promissores para a carne bovina brasileira. O mercado vietnamita, por exemplo, foi aberto em março para a carne do Brasil e já habilitou dois frigoríficos brasileiros.
Durante a cerimônia de anúncio do plano de contingência, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), afirmou, em mais de uma ocasião, que está conversando com chefes de Estado de “todos os países” e que se os EUA não quiserem comprar do Brasil, tem quem queira.
Tramitação no Congresso
A MP editada pelo governo Lula já está em vigor, mas precisa ser confirmada pelo Congresso Nacional em até 120 dias. O rito no Legislativo inclui a criação de comissão mista, além da aprovação no plenário da Câmara e do Senado Federal.
Em um gesto de alinhamento ao governo no socorro aos produtores atingidos pelo tarifaço, os presidentes da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), acompanharam o evento de lançamento das medidas.
Em publicação nas redes, Motta reconheceu a importância do tema e reafirmou o comprometimento do parlamento com soluções que protejam empresas, trabalhadores e consumidores. “Há causas que devem transcender as preferências partidárias ou ideológicas”, escreveu.
Alcolumbre, por sua vez, foi econômico ao comentar a MP e afirmou que a presença na cerimônia foi “apenas para participar de um ato que é relevante na defesa dos empregos, da defesa das empresas brasileiras”.