A agricultura regenerativa, sistema de produção agropecuária que tem como objetivo central garantir a saúde do solo, gera benefícios perenes para quem adota as práticas do modelo, afirmam produtores rurais. Os resultados, no entanto, não são imediatos, o que reitera a importância de o produtor que decidir migrar para um cultivo mais sustentável não fazer a transição de uma só vez nem mudarem assistência técnica.
“Começamos a resgatar conceitos básicos da agronomia, como um cuidado maior com a biodiversidade do solo, para buscar um ambiente que fosse mais resiliente e equilibrado. Adotamos uma visão baseada em ciência e em colaboração, abrindo a porteira da fazenda para institutos de pesquisa e universidades”, disse ela durante um dos painéis do Summit Agricultura Regenerativa, evento que a Globo Rural realizou na manhã desta segunda-feira (20/10), em São Paulo.
A propriedade incorporou as mudanças lentamente; a redução do uso de defensivos químicos, por exemplo, não foi imediata, mas paulatina. Essa estratégia permitiu à fazenda reduzir seus custos e, com o tempo, alcançar produtividade acima da média: a Três Meninas colhe 50 sacas de café por hectare, desempenho bem superior ao do Cerrado mineiro, a região de Monte Carmelo, onde a média é de 31 sacas por hectare. No Brasil, a produtividade média é de 25 sacas por hectare.
Os esforços não só compensaram como transformaram a propriedade em referência na adoção de boas práticas. Em 2024, a Três Meninas conquistou o primeiro lugar no Prêmio Fazenda Sustentável, iniciativa da Globo Rural que reconhece as propriedades rurais com as melhores práticas ambientais, sociais e econômicas do país.
“O produto regenerativo tem seu papel social e ambiental. Por uma série de razões, estamos ajudando na estabilidade da cadeia, e isso precisa ser comunicado ao consumidor”, diz a agricultora.
Ela defende um “levante” de incentivo à agricultura regenerativa, com medidas de apoio que incluem linhas de crédito diferenciadas.
Adoção de mudanças
Em Cristalina (GO), as grandes lavouras cultivadas com irrigação se destacam. Rodrigo Ribeiro Cardoso, diretor da Agrícola Whermann, relata que limitações em áreas produtivas levaram a empresa a adotar algumas mudanças, como a diversificação de cultivos e a migração de algumas culturas para áreas arrendadas.
A região produz cerca de 40 culturas, o que muitas vezes cria a chamada “ponte verde”, quando plantas hospedeiras acabam servindo de refúgio para pragas que atacam as safras principais. “Separamos áreas para plantar braquiária e, posteriormente, voltamos a cultivar batata.
A braquiária deixa 40 toneladas de matéria orgânica por hectare, e o aumento de produtividade na batata compensou todo o manejo”, relata Cardoso. Somadas as lavouras de cereais e hortaliças, a Agrícola Whermann cultiva 25 mil hectares por ano. A batata ocupa 2,5 mil hectares.
Segundo o executivo, a adoção de práticas de agricultura regenerativa é um processo de longo prazo, que exige mudança de mentalidade. “Fazemos muitos testes, temos desafios a superar, mas acredito que estamos no caminho certo”, afirma.
Bruno Afonso, produtor de coco em Petrolândia (PE), que estava na plateia do evento, contou um pouco de sua experiência. “No nosso caso, passamos a enxergar as plantas daninhas como pasto e passamos a fazer a integração entre coco e ovinocultura. Além de incorporar mais uma atividade à área, usamos o esterco dos animais como adubo, o que ajudou a reduzir o custo com nitrogenados”, resumiu.
Comunicação
A disseminação da agricultura regenerativa passa necessariamente pela divulgação dessas iniciativas ao consumidor final, avalia Márcio Milan, vice-presidente de Relações Institucionais da Associação Brasileira de Supermercados (Abras).
“As 30 milhões de pessoas que frequentam nossos supermercados todos os dias precisam ter a informação clara sobre as razões que fazem um café custar mais que o outro, por exemplo”, disse.
O executivo lembra como um trabalho bem-feito de comunicação pode gerar resultados positivos. “Em duas décadas, o consumo per capita de carne suína no Brasil praticamente dobrou. Isso partiu de um movimento dos produtores e que hoje é integrado, feito em parceria com os supermercados”, afirmou ele.
Suelma Rosa, vice-presidente de Assuntos Corporativos da PepsiCo América Latina, reiterou a importância do trabalho conjunto. “Todos os elementos da cadeia precisam estar conectados”, disse. “Nosso papel é colocar o sistema alimentar no centro”.
Para ela, é preciso estimular a produção agropecuária com integração entre ciência, tecnologia, políticas públicas, bonificação, boas práticas e justiça social. “Entendemos que nós, como empresa, representamos um agente da cadeia, mas também acreditamos que essa visão integradora pode gerar soluções mais perenes e que resultem em segurança e receita adicional”, analisou.