Menos da metade das escolas públicas brasileiras está conectada à rede de esgoto (48,2%) e apenas 38,7% das salas de aula contam com algum tipo de climatização. Os dados, divulgados pelo Anuário Brasileiro da Educação Básica 2025, evidenciam que a precariedade estrutural vai além da ausência de recursos pedagógicos e afeta diretamente o processo de aprendizagem.
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Daniele Mendes, coordenadora de Políticas Educacionais da Todos Pela Educação, explica ao Terra que os números revelam que a educação está intrinsecamente ligada às condições sociais do País.
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“A educação não é um mundo à parte. Quando falamos que as escolas não têm esgotamento, estamos falando de territórios inteiros que não têm acesso a esse serviço. Isso mostra que muitas escolas estão em áreas de vulnerabilidade social, e isso precisa ser priorizado por políticas públicas”, afirma.
Segundo o anuário, cerca de 95% das escolas públicas contam com itens básicos como energia elétrica, água potável e banheiros. Mas a ausência de saneamento, climatização e bibliotecas compromete o ambiente escolar.
“O aluno que está numa escola sem esgoto ou até mesmo sem água potável tem seu bem-estar afetado. E se o bem-estar não está garantido, não há como ter a atenção e dedicação necessárias ao processo de ensino-aprendizagem”, explica Mendes.
A coordenadora destaca ainda que infraestrutura escolar não se resume a laboratórios ou bibliotecas: trata-se de condições mínimas de conforto e saúde que impactam diretamente o desempenho. Pesquisas já apontam, por exemplo, que temperaturas elevadas reduzem o rendimento dos estudantes. No Brasil, o Estado com menor estrutura é Minas Gerais (11,7%), enquanto Rondônia lidera com 91,4%.
Desigualdade regional e social
As disparidades se tornam ainda mais visíveis quando comparadas escolas urbanas e rurais. Enquanto 71,3% das escolas públicas urbanas têm acesso a esgoto, apenas 8,8% das rurais contam com o serviço. O acesso não avança quando se considera as escolas privadas rurais (9,1%).
Em uma escala nacional, o cenário é mais crítico no Norte, onde o índice cai para 9,3%, com destaque negativo para o Amapá (7,3%).
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Para Mendes, a resposta passa pela equidade na formulação de políticas públicas: “Não basta investir mais em educação sem focalizar. As regiões que mais precisam devem receber mais apoio técnico e financeiro. A região Norte, por exemplo, enfrenta desafios logísticos e operacionais que encarecem a oferta de educação de qualidade. Isso precisa ser considerado como diretriz.”
Outro dado preocupante é a ausência de espaços de estímulo à aprendizagem. Menos da metade das escolas de Ensino Médio contam com laboratórios de Ciências (46,9%), e apenas 47,2% das unidades de Ensino Fundamental possuem bibliotecas ou salas de leitura.
“A falta de ambientes que incentivem leitura e tecnologia torna a escola menos atrativa para os jovens. Sem esses espaços, o engajamento dos estudantes cai e os professores também perdem recursos fundamentais para dar aulas mais eficazes.”
Essa carência se reflete no aumento da evasão escolar. “Quanto mais a escola for acolhedora e atrativa, menores são os riscos de abandono. Mas se faltam bibliotecas, laboratórios, saneamento ou climatização, o jovem encontra maiores dificuldades, e isso eleva as chances de distorção idade-série e evasão”, explica.
Embora 95,4% das escolas públicas estejam conectadas à internet, apenas 44,5% possuem conexão adequada para uso pedagógico.
“Esse é um grande problema, porque estamos formando jovens para o século XXI sem que eles tenham acesso a tecnologias de forma crítica e pedagógica. Muitas vezes a conexão existe, mas não há manutenção, dispositivos adequados ou estrutura para receber a rede”, aponta a coordenadora.
Segundo ela, é necessário realizar diagnósticos locais para identificar os gargalos e formular planos que assegurem a efetividade da conectividade nas escolas.
Avanços e desafios
O anuário mostra que os investimentos em educação cresceram 13% entre 2014 e 2023, somando R$ 540 bilhões em 2023, o equivalente a 4,9% do PIB. Ainda assim, o gasto por aluno no Brasil é de US$ 3.668 (cerca de R$ 19,6 mil) e está muito abaixo da média da OCDE, de US$ 11.914 (R$ 63,7 mil).
Para Mendes, não se trata apenas de aumentar recursos, mas de melhorar a gestão. “O Brasil avançou, mas ainda falta prioridade política. Muitas secretarias de educação não possuem capacidade técnica para definir estratégias de combate à desigualdade. Analisar dados e identificar onde investir é um desafio que não depende só de orçamento, mas de gestão educacional.”
Fonte: Portal Terra