O governo federal viu uma “vitória parcial” na área econômica, em relação ao decreto do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que confirmou a tarifa de 50% sobre as exportações brasileiras, mas com um rol de exceções. O plano de contingência em elaboração deve focar a absorção doméstica de alguns produtos não beneficiados com a tarifa zero, e o auxílio financeiro pontual a setores mais expostos e menos elásticos.
O cálculo inicial de fontes do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (Mdic) é de que 44,6% das exportações brasileiras ficaram isentas da sanção. Bancos públicos de fomento, como o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), devem oferecer linhas de capital de giro, financiamento à exportação e suspensão do pagamentos de dívidas, ou prorrogação de prazos. Deve também haver ajustes no plano de contingência, que tende a deixar de ser um “pacote de medidas” para se converter em uma proposta de auxílio “setorial”, ou seja, com foco em segmentos específicos.
No plano político, a preocupação no governo é traçar uma estratégia para tentar arejar o ambiente, e evitar o agravamento da crise com o governo americano. Estão no radar ações para intensificar o diálogo com as “big techs” e buscar acordos na área de mineração.
Um problema é que Trump deixou claro no decreto que a elevação da tarifa sobre produtos nacionais se deu por motivos políticos. Há receio de nova ofensiva do presidente americano, por exemplo, na hipótese de o Supremo Tribunal Federal (STF) condenar o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), e seus aliados, pela tentativa de golpe de Estado. Se isso se confirmar, a sentença deve ser proferida no fim do ano.
Agenda de cooperação
Um dos caminhos aventados pela ala do governo que defende cautela e serenidade é tentar criar uma agenda de cooperação, com foco no interesse dos americanos. Começando por ampliar o diálogo com as “big techs” sobre a regulação das plataformas, debate que foi deflagrado pelo vice-presidente e ministro do Mdic, Geraldo Alckmin, nessa terça-feira (29), e contou com a participação de um representante do governo americano.
Outro foco é intensificar as conversas sobre minerais críticos, já que os americanos demonstraram interesse na exploração de terras raras, níquel e lítio, por exemplo. A ideia é buscar “acordos consistentes” com os EUA, ressaltou uma fonte credenciada do governo.
Pelo viés econômico, o governo recebeu com alívio a notícia de que setores importantes como aviação civil, celulose, sucos e petroquímicos não foram alvejados pelo tarifaço, poupando dos ônus empresas estratégicas, como a Embraer, e a indústria de suco de laranja.
Em contraponto, o foco, agora, passa a ser alinhar o plano de contingência, esboçado pelo Ministério da Fazenda, aos setores mais afetados pelo tarifaço, como café, carne, frutas, pescados e de máquinas e equipamentos.
Frutas e café
Os ministros do Desenvolvimento Agrário (MDA), Paulo Teixeira, e do Empreendedorismo e Microempresa, Márcio França, sugeriram o subsídio e o direcionamento para escolas públicas de produtos perecíveis que sejam afetados pelo tarifaço, como frutas, principalmente manga, e café. “Como os valores são pequenos perto do todo, perto de um avião, da laranja, é que a gente possa subsidiar e colocar na rede pública de merenda de alimentação”, disse França, no programa “Bom Dia, Ministro”.
Nessa quarta-feira, o secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, avaliou de forma preliminar que o anúncio dos Estados Unidos de que vários produtos brasileiros foram isentos da taxação extra de 50% traz um cenário mais “benigno” e “positivo” para o Brasil.
“Me parece que, do ponto de vista efeito econômico, é positivo, ou seja, é melhor do que o cenário anterior. Agora, precisa-se entender um pouco os detalhes”, afirmou Ceron, explicando que o anúncio dos Estados Unidos foi feito durante a coletiva de imprensa para comentar o resultado primário do governo central, por isso ele não teve tempo de analisar o documento emitido.
“Dentro dos cenários possíveis, é um cenário que não está no pior possível. Então, ele ainda representa um cenário mais benigno do que poderia ser”, observou.
O plano de contingência em discussão na Fazenda, prevê que de dez a 15 instituições públicas de fomento, entre federais e subnacionais, já estão com planos prontos a fim de combater os efeitos econômicos da tarifa de 50% sobre exportações de bens do Brasil para os Estados Unidos.
As medidas são basicamente de capital de giro, financiamento à exportação e suspensão de pagamentos de dívidas, de acordo com fontes ouvidas pelo Valor. Em alguns casos, também estão sendo discutidas medidas voltadas à equalização de juros. A avaliação das fontes envolvidas na elaboração dos planos é que os pacotes têm semelhança com as medidas adotadas durante a pandemia. Esses planos já estão acordados com governo federal e com os governadores.