O acordo entre Estados Unidos e China para suspensão por 90 dias das tarifas recíprocas aplicadas pelos dois países levou mais volatilidade ao mercado da soja na bolsa de Chicago. Diante da constatação de que o pacto pode viabilizar novamente as vendas do produto americano aos chineses, as contratos futuros para julho subiram 1,85% no pregão ontem, para US$ 10,7125 o bushel.
Isso mesmo num cenário que seria naturalmente de baixa no mercado, dada a finalização da colheita recorde de soja no Brasil e do ritmo acelerado do plantio do grão nos Estados Unidos.
Para Rafael Silveira, analista da Safras & Mercado, com o acordo, a China pode direcionar parte de sua demanda de soja para EUA. “A guerra tarifária e as retaliações da China inviabilizaram qualquer negócio entre os dois países. Agora com essa tarifa de 10%, o acordo pode ser crucial para que os chineses antecipem as compras de soja da nova temporada [2025/26] durante esses 90 dias”, afirmou.
No entanto, acrescentou, ainda que as relações comerciais entre EUA e China melhorem, o Brasil não é carta fora do baralho quando o assunto é exportação de soja aos chineses.
“O acordo tira um pouco de pressão das exportações do Brasil, mas elas não devem cair significativamente. Os produtores brasileiros já comercializaram 100 milhões de toneladas, e grande parte disso foi destinado à exportação”, afirmou Silveira.
Marcela Marini, analista sênior de grãos e oleaginosas do Rabobank, disse que a China comprou 20 milhões de toneladas de soja americana referentes à safra 2024/25. Para ela, a redução de tarifas abre espaço para a exportação dos EUA, a partir de agosto. Mas, assim como Silveira, ela não vê o acordo comercial como entrave à soja brasileira.
Segundo ela, a expectativa é saber o que acontecerá no segundo semestre, caso o pacto entre americanos e chineses seja seguido à risca. “Anteriormente, com o quadro de tarifas retaliatórias, esperávamos que as vendas do Brasil para o mercado chinês acontecessem até dezembro. Agora fica a dúvida sobre o ritmo de compras da China e também a competitividade da soja colhida aqui, já que teremos a chegada da safra americana”, disse.
Para Silveira, da Safras & Mercado, o acordo entre chineses e americanos pode ter impacto direto no prêmio da soja nos portos brasileiros, que passariam a ser negativos, com a soja brasileira sendo preterida pelo grão dos EUA. Atualmente, o prêmio da soja, base Paranaguá (PR), está em US$ 0,75 o bushel para embarque em agosto. O prêmio é a diferença entre o preço do produto físico em determinada praça e a cotação em Chicago.
Para o Departamento de Agricultura dos EUA (USDA), a demanda chinesa por soja deve seguir aquecida. Ontem, o órgão estimou que a China vai importar 112 milhões de toneladas no ciclo 2025/26, acréscimo de 4 milhões em relação à safra atual. O dado contribui para a alta em Chicago.
As projeções do relatório de oferta e demanda dos USDA, as primeiras do novo ciclo que começa em setembro, também mexeram com as cotações do milho em Chicago. Os lotes para julho caíram 0,39%, para US$ 4,48 o bushel.
De acordo com o órgão americano, a safra mundial de milho deverá atingir 1,26 bilhão de toneladas. Se o volume se concretizar, será 3,5% superior à safra atual. Para os EUA, onde os números trazem peso extra aos preços futuros, a safra pode ser de 401,85 milhões de toneladas, 6% mais que na temporada atual, e também um recorde.
Estimativas robustas para a produção mundial de trigo também fizeram o preço do trigo cair em Chicago. Os lotes para julho fecharam em baixa de 1,25%, para US$ 5,1525 o bushel. O USDA espera uma safra inédita de trigo no mundo, de 808,5 milhões de toneladas na temporada 2025/26.
Já para os EUA, a previsão é de uma colheita de 52,28 milhões de toneladas, redução de 1,37 milhão de toneladas na comparação com a temporada anterior. Apesar disso, os estoques finais do país deverão crescer, de 22,90 milhões de toneladas para 25,12 milhões de toneladas no próximo ciclo. (Colaboraram Fernanda Pressinott e Cleyton Vilarino, de São Paulo)