A apreensão com a futura política comercial no segundo mandato de Donald Trump fez a China antecipar as compras de soja dos Estados Unidos no fim de 2024, reduzindo a aquisição do grão brasileiro neste início de ano. Ainda assim, o ritmo de comercialização no Brasil é superior ao de igual momento do ano passado, já que produtores estão aproveitando o estímulo do câmbio.
Segundo a Safras & Mercado, as negociações de soja do ciclo 2024/25 chegaram a 35% da produção esperada, o equivalente a 60,83 milhões de toneladas. No mesmo período um ano atrás, a comercialização antecipada era de 29,1%. O percentual, no entanto, ainda está abaixo da média dos últimos cinco anos, de 39%.
A China, principal comprador da soja brasileira, neste momento está fora do mercado. O país asiático importou um volume recorde do grão em 2024, antecipando eventuais tarifas prometidas por Donald Trump.
Para Rafael Silveira, analista da Safras & Mercado, com um volume de colheita ainda incipiente no Brasil, a comercialização de soja deve ganhar fôlego em meados de fevereiro. “Os chineses são muito pragmáticos e vão esperar o momento certo para direcionar a demanda para o Brasil. Em fevereiro teremos o pico da comercialização. O câmbio, no patamar que está, também deve favorecer a procura por soja brasileira”, afirma.
Segundo Anderson Galvão, CEO da Céleres, o maior impacto no mercado de soja neste momento vem da alta do dólar, que permitiu melhora nos preços do grão em reais. “O câmbio ainda vai ajudar no preço da soja no começo da colheita. Cada dez centavos [de valorização do dólar] aumenta em R$ 5 a saca, na média”, estima.
Pelas projeções da Safras & Mercado, as exportações brasileiras de soja devem somar 107 milhões de toneladas na safra 2024/25. Entre 80 milhões e 81 milhões de toneladas terão como destino a China. Na temporada anterior, foram 77,5 milhões, segundo a consultoria. A maior safra esperada no Brasil é o motivo para o crescimento.
Plinio Nastari, presidente da Datagro, pondera que a China depende da produção brasileira de soja, e deve voltar às compras ao longo da colheita. “Por mais que tenham antecipado compras nos EUA, eles vão acabar tendo que voltar a comprar soja do Brasil, inevitavelmente”, diz. No ano passado, 73,4% da soja brasileira exportada foi para a China, 2,6% menos que em 2023.
De acordo com a estimativa da Datagro, a comercialização da safra 2024/25 de soja no Brasil chegou a 35% do volume estimado. Há um ano, o índice era de 30%.
Se os chineses demandam menos agora, por outro lado, produtores também estão na expectativa do que virá num próximo governo Trump. Por isso, os negócios não avançaram mais, afirma Leandro Guerra, da LC Guerra Corretora de Cereais.
“Conversando com produtores, há muita dúvida se os EUA irão taxar a China novamente. A chance de uma nova guerra comercial traz a expectativa de alta do prêmio dos portos e da demanda por soja brasileira. Sem esse fator geopolítico, as vendas antecipadas estariam acima dos 40%”, avalia.
Segundo ele, alguns produtores esperam um cenário semelhante ao de 2018, no primeiro mandato de Trump, quando a guerra comercial EUA-China favoreceu a soja brasileira.
“O que a gente viu em 2018 foi uma demanda muito agressiva pela soja do Brasil. Os prêmios subiram até 200 pontos, batendo recordes consecutivos. Foi uma virada de chave muito rápida no mercado. O produtor relembra desse contexto e pensa que isso pode acontecer mais uma vez”, observa.
Tiago Medeiros, diretor da Czarnikow, tem a mesma percepção e afirma que “todo mundo trabalha com a hipótese de retorno das sanções do primeiro governo Trump”. Para ele, porém, as especulações sobre uma reedição da guerra comercial não trazem reflexos para a venda brasileira de soja atualmente. “Vai impactar o próximo ciclo brasileiro”, avalia. No levantamento da Czarnikow, as vendas desta safra estão atrasadas, em 35% – um ano atrás, estavam em ao menos 40%.