O acordo de livre comércio entre o Mercosul e a União Europeia (UE) “constrói uma ponte” entre os dois lados do Atlântico.
E os setores do mercado brasileiro que mais devem se beneficiar dessa travessia são os exportadores num geral – com destaque para as empresas de commodities -, mas em especial o agronegócio e, sobretudo, os frigoríficos, segundo analistas ouvidos pela CNN.
“Quem ganha mais é agronegócio. O agro brasileiro já é muito mais competitivo do que o europeu, e a eliminação de tarifas para mais de 90% dos produtos comercializados entre os blocos beneficiará setores de carnes bovina, suína e de aves, que terão acesso ampliado ao mercado europeu, aumentando a ainda mais a competitividade brasileira”, aponta Graziano Messana, presidente da Eurochambers Brazil.
“Também o setor de logística e infraestrutura pode indiretamente se beneficiar porque as indústrias e incremento de fluxo comercial estão ligados à logística, transporte marítimo e infraestrutura portuária”, conclui.
Outros produtos destacados por Messana são soja, milho e café.
Com o acesso ao mercado europeu, Rafael Dadoorian, sócio-fundador da Convexa, aponta para uma dupla valorização do produto nacional. A entrada em um mercado exigente, no qual é necessária grande qualificação para ser comercializado, serve de vitrine para as exportações brasileiras.
“O acordo é uma chance de o Brasil se destacar ainda mais no comércio global. Para o setor frigorífico, é uma oportunidade de consolidar nossa posição como referência em proteína animal, mas isso vai exigir que o país jogue bem o jogo europeu – oferecendo rastreabilidade dos produtos e sustentabilidade da produção, tudo aquilo que é uma exigência do mercado europeu”, enfatiza Dadoorian.
“Além disso, países como a França temem prejuízos para os agricultores e os mercados locais, o que pode aumentar as exigências para o Brasil”, conclui o sócio-fundador da Convexa.
E com o mercado brasileiro crescendo lá fora, os negócios tupiniquins também devem inflar na cena doméstica. Os agentes econômicos vinham acompanhando de perto os desdobramentos das negociações, e agora que foram concluídas, as expectativas se voltam para as empresas destes setores beneficiados.
Do ponto de vista do Ibovespa, os analistas ouvidos pela CNN destacam empresas como:
- JBS;
- BRF;
- Marfrig;
- Minerva;
- Cosan e Raízen, também devido o foco europeu em sustentabilidade, enfatiza Messana;
- Vale;
- as indústrias siderúrgicas;
“Nossa indústria também pode se beneficiar, como WEG e Embraer, apesar de serem empresas que também podem ter alguma competição internamente”, ressalta Matheus Amaral, especialista em renda variável do Inter.
Atração de investimentos
Com um cenário econômico incerto, o Brasil tem sofrido para manter o investidor estrangeiro entretido com as oportunidades por aqui. Os gringos retiram mais de R$ 3 bilhões do Ibovespa em novembro, levando a parcial do ano acumular fuga de R$ 25,9 bilhões, revertendo quatro anos seguidos de resultados positivos, e levando 2024 a caminhar para um dos piores resultados em quase uma década.
Porém, os analistas ouvidos pela CNN apontam que o acordo, cujo foco principal é viabilizar o comércio entre os países, pode também ter um efeito indireto na atração de investimentos para o Brasil.
“Agora, se [o acordo] pode ajudar a trazer investimentos, com certeza. O que eu vejo como principais benefícios são que o tratado também tem vários pontos de garantia e proposta de melhoria. Sempre de padrões de produção, de facilitação”, avalia Lucas Sigu Souza, sócio-fundador da Ciano Investimentos.
“Só com a desburocratização do livre comércio entre os países, você já deixa muito mais coisas fluidas. Então, mesmo que as taxas se mantivessem, a desburocratização de todos os processos, da maioria dos processos, já é motivo para viabilizar negócios. Se estamos viabilizando negócios, significa que existe dinheiro se direcionando para esses negócios”, conclui Souza.
Desafios
Mas a porta que se abre para um lado, também é aberta para o outro.
“O acordo traz boas perspectivas, mas o sucesso não vai cair do céu. O Brasil precisa ter uma boa estratégia para aproveitar o momento, porque o mercado interno, com toda sua fragilidade, não será um grande suporte”, pontua Dadoorian.
Enquanto o agronegócio da América do Sul – e principalmente o brasileiro – ganha em competitividade contra o europeu, podendo se favorecer no merado de lá; as indústrias que são mais fortes na Europa podem acabar ganhando por aqui.
Por exemplo, os analistas ouvidos pela CNN se dividem sobre a posição de marcas como a Ambev; que por um lado é grande e pode sair na frente com tarifas menores para bebidas, mas por outro pode encontrar competidores a altura na Europa.
Porém, Patrícia Krause, economista-chefe da Latin América Coface, aponta que os setores que devem ficar mais vulneráveis no Brasil são os farmacêuticos, de máquinas e equipamentos elétricos.
Uma das preocupações levantadas era na competição entre a indústria automotiva do Brasil com a europeia. Contudo, termos anunciados pelo governo do Brasil indicam que o acordo contempla um mecanismo de salvaguarda para “preservar e ampliar” investimentos automotivos.
Ademais, a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) avaliou nesta sexta que o tratado é positivo e parece beneficiar ambas as partes, além de fomentar os investimentos na indústria.