O Ministério da Agricultura encampou reclamações do setor produtivo e pediu formalmente ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad, para alterar a resolução do Conselho Monetário Nacional (CMN) 5.081/2023, que trata de restrições e impedimentos socioambientais para a concessão de crédito rural no país.
A Pasta disse que a norma tem gerado reflexos adversos no acesso aos financiamentos por produtores brasileiros neste ano. O argumento é rechaçado por integrantes da área ambiental e econômica do governo que defendem a manutenção do texto com regras mais rígidas.
A resolução apertou o cerco contra o desmatamento ilegal e passou a vedar a contratação de crédito a toda a extensão da propriedade rural que tiver alguma área embargada por conta disso, e não mais apenas à porção do imóvel onde foi apontada a irregularidade.
A proposta de ajuste no ofício apresentado pelo ministério pede para que a vedação seja exclusivamente ao polígono embargado e não a propriedade inteira. A sugestão também é que a restrição não alcance quem sofreu embargo, mas já firmou Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) para regularização da área.
A regra atual, segundo expôs o Ministério da Agricultura, impõe ações mais rígidas que a própria legislação ambiental brasileira. A reclamação do setor e do ministro Carlos Fávaro é que o embargo é um instrumento cautelar, para evitar que o dano ambiental se agrave e viabilizar a regeneração da vegetação no local desmatado, e não punitivo por si só. Ou seja, deve haver uma análise da situação.
A equipe de Fávaro chegou a sugerir a ideia de que propriedades desmatadas, ainda que não tenham sido alvo de embargo ambiental, deveriam apresentar a autorização de supressão da vegetação solicitada ao órgão ambiental estadual no ato de contratação do crédito. O mecanismo daria garantias adicionais aos bancos de que o desmatamento não foi ilegal e permitiria a fluidez dos financiamentos.
O Ministério da Agricultura também indicou que o sistema de embargos do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) não tem conseguido alcançar todos os desmatamentos ilegais e que o processo de desembargo depende da análise do Cadastro Ambiental Rural (CAR), processo que continua extremamente lento nos Estados, o que retarda a liberação das áreas.
A resolução 5.081/2023 também veda a contratação de crédito rural para áreas sobrepostas a florestas públicas não destinadas. Chamadas de florestas públicas tipo B, são terras que pertencem à União e que ainda não foram tituladas.
De acordo com dados apresentados em reunião de Fávaro e Haddad na quarta-feira, apenas em Mato Grosso existem 19,9 mil imóveis cujo CAR tem sobreposição com florestas públicas tipo B. A área soma 1,4 milhão de hectares de cultivo de soja.
O Ministério da Agricultura pediu para que o CMN ajuste o texto da norma e permita a concessão de crédito para as os imóveis rurais sobrepostos parcialmente com florestas públicas não destinadas em que os produtores já possuam Certificados de Reconhecimento de Ocupação (CRO) ativos. Para acessar os financiamentos, os proprietários teriam que comprovar, adicionalmente, que cumprem o Código Florestal e mantêm de pé as matas no percentual mínimo exigido de áreas de preservação permanente (APP) e reserva legal.
Reclamação do setor produtivo
O setor diz que milhares de produtores têm sido afetados, principalmente na região amazônica, e que os efeitos da norma não são residuais. Já um integrante do governo disse que esse discurso atende “desmatador” e que há uma pressão indevida contra a norma.
“Nem mesmo com os eventos climáticos extremos essas pessoas aprendem a respeitar o meio ambiente. O discurso é que são poucos os devastadores que desrespeitam a legislação ambiental. Quando o governo cria uma regra para punir estes poucos, reclamam. Ou eles não são poucos ou não querem punir ninguém”, afirmou, sob anonimato.
Segundo dados compilados pela equipe de Fávaro, a resolução afeta diretamente 200 imóveis com alguma dimensão de embargo, e 1,7 mil áreas produtivas não tituladas só em Mato Grosso. Só no Banco do Brasil, são quase 1,8 mil operações evitadas no país por conta da regra em valores que passam de R$ 2,7 bilhões, de acordo com as informações discutidas na reunião da semana passada. Procurado, o BB não confirmou, mas também não negou os dados.
A resolução determina ainda que não seja concedido crédito rural para empreendimento situado em imóvel rural que não esteja inscrito ou cuja inscrição se encontre cancelada ou suspensa CAR. Um relatório do Banco Central mostra que no primeiro semestre deste ano foi evitada a efetivação de mais de 30 mil tentativas de financiamentos com as inconsistências relativas ao cadastro tratadas na resolução. O valor das operações somava R$ 6,3 bilhões.
Para a norma ser alterada, o Ministério da Fazenda precisa enviar uma sugestão de voto ao CMN. Procurados, os ministérios não responderam.