É possível monitorar os níveis de glicose a partir da voz? É o que pesquisadores tentam desvendar atualmente. Segundo um estudo publicado no final de agosto na revista Scientific Reports, da Nature, foi identificada uma relação entre mudanças nos níveis de glicose no sangue e alterações na voz.
Uma das hipóteses que pode explicar essa relação está baseada na Lei de Hooke. Estabelecida pelo inglês Robert Hooke (1635-1703), a lei descreve a deformação de corpos elásticos.
Sabe-se, atualmente, que a voz é produzida a partir de vibrações das chamadas pregas vocais, duas dobras de músculo e mucosa localizadas na laringe. Nesse sentido, variações nos níveis de glicose no sangue levariam a alterações nas propriedades elásticas dessas pregas, o que, consequentemente, alteraria também a frequência e o tom da voz.
Outra hipótese levantada é a de que complicações da diabete 2, como a formação de edemas na região das pregas vocais, possam impactar a vibração do som.
Como foi realizada a pesquisa e resultados encontrados
Para entender melhor essas hipóteses, a pesquisa comandada por Jaycee Kaufman, cientista-chefe da Klick Health, analisou as vozes de 505 pessoas, entre homens e mulheres, que apresentavam pré-diabetes (89), diabetes tipo 2 (174) e os que não tinham a doença (242).
Ao longo de duas semanas, os participantes mediram a glicose a cada 15 minutos com monitores contínuos de glicose (CGM), um tipo de sensor instalado na pele do paciente.
Eles também gravaram, anonimamente, frases como: “olá, como vai? Qual é o meu nível de glicose neste momento?”, pelo menos seis vezes ao dia.
Após a análise dos conteúdos gravados, foi identificada uma pequena, mas significativa, relação linear entre níveis de glicose e tom da voz.
Isso significa que, quando a glicose no sangue aumenta, o tom da voz também tende a aumentar.
Para se ter uma ideia, uma elevação de 1 mg/dL de glicose correspondia a um aumento de 0,02 Hz da frequência vocal.
Achados podem mudar o monitoramento de glicose
A pesquisa se mostra promissora para revolucionar o atual cenário de monitoramento da glicose.
Atualmente, esse monitoramento envolve a realização de teste de picada no dedo e o uso de CGM.
Entretanto, esses métodos são invasivos e apresentam limitações, além de causarem desconforto, especialmente na região onde é feita a picada com a agulha, e gerarem custos para a compra dos dispositivos.
“Os métodos atuais de monitoramento de glicose são invasivos e inconvenientes. Desse modo, o monitoramento baseado na voz poderia ser tão simples quanto falar em um smartphone, o que mudaria o jogo para 463 milhões de pessoas de todo o mundo que convivem com diabetes tipo 2”, diz Jaycee em comunicado da Klick Health.
É importante destacar, porém, que o estudo ainda apresenta limitações, especialmente porque fatores externos, como infecções respiratórias, saúde emocional e alergias, podem influenciar o tom de voz.
Dito isso, novos estudos devem ser realizados no futuro para comprovar se há ou não uma relação de causa e efeito entre a variação dos níveis de glicose e mudanças na voz.