A ABC estava lutando para encontrar sucessos em 2004, quando a rede lançou dois deles: “Desperate Housewives”, uma nova versão de uma novela do horário nobre, e “Lost”, um mistério com toque de ficção científica que rapidamente se tornou uma sensação entre os fãs, desde seus números enigmáticos até o que realmente aconteceu com aquele avião acidentado e seus passageiros.
Dos dois, porém, foi “Lost” que mudou fundamentalmente a televisão e a relação entre os criadores de programas de TV e as redes que os transmitiam – alimentando o que poderia ser chamado de novelização da televisão – e não na forma como a série começou, mas sim como terminou em 2010.
As raízes disso começaram anos antes, quando os produtores executivos do programa, Damon Lindelof e Carlton Cuse, reconheceram que as avaliações da série misteriosa estavam começando a sofrer em função do comprometimento dos telespectadores. Os fãs queriam saber quando obteriam algumas respostas.
A pedido deles, no que a Variety chamou de “peça de mudança de paradigma”, a ABC permitiu que anunciassem uma data oficial de término da série, encomendando 48 episódios ao longo de três temporadas para completar a história. O anúncio serviu de aviso de que a trama estava realmente caminhando para algo, que uma recompensa aguardava aqueles que estavam acompanhado durante todo esse tempo o programa.
Até então, o mote predominante na televisão era, em essência, se não está quebrado, não conserte. As séries duravam até o público parar de assisti-las, não quando os criadores dissessem, como se fossem romancistas, que tivessem chegado ao fim da história.
“Acho que para programas baseados em histórias como ‘Lost’, ao contrário de programas baseados em franquias como ‘ER’ ou ‘CSI’, o público quer saber quando a história vai acabar”, afirmou Cuse na época, explicando a comparação acrescentando: “Quando J.K. Rowling anunciou que haveria sete livros de ‘Harry Potter’, isso deu aos leitores uma noção clara de exatamente qual seria seu investimento. Queremos que nosso público faça o mesmo.”
O produtor da ABC, JJ Abrams, que co-criou a série com Lindelof e Jeffrey Lieber, na época chamou a decisão de “a escolha certa”, dando crédito à ABC por ter “verdadeira visão e coragem para tomar uma decisão como esta”.
Desde então, sem dúvida, um tipo diferente de televisão surgiu e criou raízes, dando aos criadores mais liberdade para decidir o prazo de validade das suas histórias. Isso incluiu o crescimento de séries limitadas que oferecem a promessa de encerramento e finalidade, criando arcos com começo e fim claros.
Outras produções seguiram esse exemplo, de “Game of Thrones”, com sua conclusão de oito temporadas, a “Stranger Things”, e mais recentemente “The Boys”, que anunciou que a quinta temporada da sátira de super-heróis encerrará a história.
Essa equação tornou a TV mais rica e ambiciosa, bem como capaz de lidar com diferentes tipos de narrativa. Imediatamente após isso, os filhos de “Lost” – muitos no início, como sempre são quando algo inesperadamente dá certo – se beneficiaram desse modelo, à medida que as redes encomendaram mais projetos com mistérios embutidos, mesmo que poucos deles pudessem viver até a sua promessa.
Mesmo que “Lost” não tenha atingido o auge, produzindo um final que respondeu a muitas de suas perguntas, mas foi frustrante em sua resolução, a série mostrou que saber quando terminar não é exatamente o mesmo que saber como. A essa altura, porém, o legado do programa estava seguro.
O fim de “Lost” pode não ter evocado um final digno de todo o hype, porém, ajudou a direcionar a TV para uma nova abordagem de contar histórias, que pode ser a fórmula que realmente importa no futuro.
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