O Brasil é o maior importador mundial de fertilizantes, mas segue altamente sensível a variações externas de oferta, preço e transporte, ao mesmo tempo em que enfrenta limitações internas para diversificar fornecedores e ampliar a produção doméstica, disse estudo do Insper Agro divulgado nesta quarta-feira (26/11) em evento em São Paulo.
O levantamento mostra que o país responde por 23% de toda a demanda global mas, ainda assim, seu poder de barganha permanece reduzido devido à elevada concentração da oferta internacional, dominada principalmente por Rússia e China, responsáveis juntas por 41% das exportações mundiais, apontou o coordenador do estudo e do Insper Agro, Marcos Jank.
O estudo destaca ainda que 45% dos países fornecedores de fertilizantes ao agronegócio brasileiro são considerados geopoliticamente instáveis.
Segundo os dados compilados, o Brasil importou 44 milhões de toneladas em 2024, volume composto por 43% de fertilizantes potássicos (K), 35% nitrogenados (N) e 22% fosfatados (P). “O potássio é nosso calcanhar de Aquiles da soberania brasileira”, disse Alberto Pfeifer, policy fellow do Insper Agro Global, uma vez que 97% do que é consumido no Brasil é importado, e 40% desse total tem origem na Rússia.
No curto e médio prazo, a análise indica que a Rússia continuará sendo um fornecedor central e dificilmente substituível para o Brasil. Essa dependência reforça a exposição do país a oscilações de preço, uma vez que os fertilizantes representam hoje mais de 20% do custo de produção das principais culturas agrícolas.
Em 2022, choques geopolíticos e energéticos elevaram em 129% os preços internacionais. O estudo também cita que, em 2025, há risco adicional associado à possibilidade de novas tarifas dos Estados Unidos sobre compradores de insumos russos, incluindo derivados de petróleo e fertilizantes.
A logística também foi apontada como um fator crítico, devido a rotas “extremamente sensíveis”, segundo Pfeifer. As importações brasileiras dependem de rotas sujeitas a gargalos externos, como os estreitos de Hormuz e de Suez, além do Canal do Panamá e do mar Báltico, e enfrentam entraves internos, incluindo longas distâncias de escoamento, malha rodoviária limitada e alta concentração de desembarques em poucos portos.
Redução da dependência
O relatório indica a necessidade, a curto prazo, de ampliar a diversificação de fornecedores, especialmente entre países considerados menos expostos a instabilidades externas, como a União Europeia, Marrocos, Noruega e Chile, por exemplo.
Além disso, os pesquisadores sugerem uma maior coordenação de janelas de atração para fertilizantes nos portos de Paranaguá e Santos. O documento também aponta que políticas fiscais atualmente vigentes no setor precisam ser reavaliadas quanto à sua efetividade, como o Convênio ICMS 26/2021.
Para o médio e longo prazo, o estudo destaca a importância de medidas que fortaleçam a capacidade interna de produção, por meio da atração de empresas com tecnologias avançadas e de parcerias público-privadas. “O setor tem programas hoje para criar produção doméstica, mas é tudo de longo prazo”, disse Jank.
Outro ponto enfatizado é o uso da chamada “diplomacia dos fertilizantes”, aproximando negociações de compra de insumos das exportações brasileiras do agronegócio.
A ampliação de contratos integrados entre fornecedores de grãos e de fertilizantes em regiões atendidas por ferrovias e hidrovias, como o Arco Norte, assim como a difusão de agricultura de precisão e a criação de rotas logísticas alternativas, também aparecem como caminhos para reduzir a dependência externa.
Segurança jurídica
Políticas públicas e segurança jurídica ainda são insuficientes para estimular novos investimentos em fertilizantes no Brasil e reduzir a dependência de insumos importados, segundo representantes de entidades do setor.
“O Brasil, apesar de ter esse agro pujante e segurança alimentar, a gente não pode dizer que a gente tem soberania alimentar, porque temos dependência de fertilizantes. Se o agro é o motor econômico do país, o fertilizante é a gasolina”, disse Bernardo Silva, diretor-executivo do Sindicato Nacional da Indústria de Matérias-Primas para Fertilizantes (Sinprifert).
Silva ressaltou que alguns insumos estratégicos, como o enxofre, essencial para a produção de ácido sulfúrico, são quase integralmente importados. “O Brasil é 100% dependente de enxofre, praticamente. Sem enxofre não tem ácido sulfúrico utilizado para a produção de muitos fertilizantes”, afirmou. Ele citou ainda o potencial nacional em gás natural, biometano, energia renovável e jazidas de fosfato e potássio.
Para Silva, o país possui recursos naturais e condições energéticas para ampliar a produção doméstica, mas uma combinação de fatores institucionais e regulatórios. “Me mostre o incentivo que eu te mostro o resultado”, disse, ao relatar que o setor passou anos sem políticas públicas específicas e com presença reduzida de grandes empresas nacionais. Silva destacou que o país vive um “momento de reversão desse ciclo”, mas alertou para os riscos geopolíticos associados à atual dependência.
Em sua avaliação, mesmo com o Plano Nacional de Fertilizantes (PNF), que prevê metas a longo prazo, até 2050, o Brasil seguirá dependente da oferta internacional. “O PNF prevê metas até 2050 para diminuir a dependência de 90% para algo entre 45% e 50%. A gente ainda vai depender. Não seremos autossustentáveis e nem é o caso”, completou.
Também presente no evento, Ricardo Tortorella, diretor-executivo da Associação Nacional para Difusão de Adubos (ANDA), avaliou que o PNF é “bastante razoável no papel”, mas disse que sua implementação avança pouco.
Segundo ele, empresários continuam sem segurança jurídica suficiente para justificar investimentos elevados em novas plantas e projetos industriais, o que limita a expansão da capacidade produtiva nacional.







